Turquia - reeleição consagra Erdogan como o presidente mais poderoso da história do país
No dia 24 de junho, o presidente turco Recep Tayyip Erdogan, do Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP), venceu as eleições presidenciais no primeiro turno. “A vencedora destas eleições é a democracia, a vontade nacional. O vencedor destas eleições é cada um dos 81 milhões de nossos concidadãos”, exclamou Erdogan ao comemorar a vitória.
Erdoan está há 15 anos poder, reconhecido como o presidente mais poderoso da história da Turquia desde que Mustafa Kemal Atatürk fundou a República (1923). A trajetória de Erdogan começou em 2003, então como primeiro-ministro e, a partir de 2014, como presidente. Agora ele vai cumprir um novo mandato de cinco anos, com a vantagem de manter a maioria no Parlamento.
O principal rival do presidente Erdogan na recente eleição turca, Muharrem Ince, denunciou casos de fraudes na votação, mas considerou que a margem de vitória de Erdogan (52,6%) não pode ser justificada por irregularidades.
Umas das características do pleito foi o fortalecimento da oposição, que se uniu em uma inesperada aliança. As dificuldades de campanha foram muitas. Oficialmente, os comícios eram proibidos. Diante do controle exercido pelo governo sobre os principais meios de comunicação, alguns candidatos de oposição usaram as redes sociais como meio de contato com o eleitor.
Eleições adiantadas e sob estado de emergência
As eleições presidenciais e parlamentares da Turquia iriam ocorrer somente em novembro de 2019, com o fim da legislatura atual. Mas em abril deste ano, o Parlamento determinou o adiantamento do pleito para escolher o chefe do Executivo e os integrantes do Legislativo. Com a medida, Erdogan enfrentou uma oposição desorganizada, que teve que correr para lançar seus candidatos.
A eleição de junho aconteceu com o país sob estado de emergência, medida imposta logo após a fracassada tentativa de golpe de Estado de 2016, realizada por parte das forças armadas. O atual regime de exceção turco impõe restrições à liberdade de expressão, reunião e associação. O que se seguiu foi uma forte onda de repressão contra opositores e críticos do governo.
A ONU criticou a realização das eleições em pleno estado de exceção, o que ameaçaria a credibilidade da votação e os princípios de uma democracia plena. Para o organismo, essas medidas prejudicaram a habilidade da sociedade civil, do Judiciário e da mídia de atuar no monitoramento da vida pública. “É difícil imaginar como eleições credíveis podem ser realizadas em um ambiente onde visões discordantes e que desafiam o partido governante são penalizadas tão severamente”, disse o alto-comissário da ONU para os Direitos Humanos, Zeid Ra’ad Al Hussein.
O expurgo político em massa provocou críticas dos países do Ocidente. Desde 2016, 55 mil pessoas foram presas na Turquia, acusado de ameaçar o Estado. Mais de 140 mil funcionários públicos foram exonerados por decreto. As autoridades também fecharam o cerco à imprensa, com o encerramento das atividades de 149 veículos e a prisão de 269 jornalistas. Políticos de oposição, funcionários de organizações não governamentais e militantes de direitos humanos também foram presos.
Novos poderes para o presidente
Passadas as últimas eleições, a Turquia abolirá o sistema parlamentarista de governo e entrará em vigor o sistema presidencialista. O cargo de primeiro-ministro será extinto e o Poder Executivo se concentrará nas mãos do presidente, que pode nomear ministros e membros do Judiciário, além de promulgar leis por decreto (embora o Parlamento possa anulá-los).
Para Erdogan, as medidas vão deixar o governo mais estável. Mas a oposição critica a entrada em vigor da reforma constitucional por temer que ela seja apenas um caminho para transformar a Turquia em um Estado de um homem só. Segundo o candidato Muharrem Ince, a medida fez com que a Turquia se tornasse um “regime autocrático” e que o presidente criou uma “sociedade de medo”.
Os poderes do presidente foram ampliados por uma reforma constitucional, proposta por Erdogan e aprovada por um placar apertado em referendo popular realizado no ano passado. Nos últimos quatro anos, mesmo no cargo de presidente (que teoricamente seria apenas representativo no Parlamentarismo), Erdogan continuou a controlar a política no país.
Popularidade em alta
O conservador islâmico Recep Tayyip Erdogan, de 64 anos, começou sua trajetória política como prefeito de Istambul. Sua gestão bem-sucedida o fez vencer todas as eleições desde que o AKP, partido que fundou, chegou ao poder em 2002. Ele é um líder popular e possui a imagem de um presidente firme, que peitou o Ocidente e fez a economia crescer.
Em sua gestão, Erdogan transformou profundamente a Turquia, com políticas de desenvolvimento econômico e investimentos em megaprojetos de infraestrutura. Entre 2002 e 2006, o país cresceu em uma taxa anual de 7.2%. Hoje, apesar de a economia turca enfrentar uma crise, o presidente ainda mantém a imagem de ter realizado um milagre econômico.
A religião também teve um grande peso em seus mandatos. A Turquia é um país laico e Erdogan reforçou o discurso religioso, ganhando a simpatia dos mulçumanos, que representam a maioria da população. Ele promoveu reformas como liberar a expressão religiosa e inserir o ensino religioso em escolas públicas. Em seus discursos e comícios, o presidente costuma foca em mensagens nacionalistas e citar o Alcorão.
Erdogan foi o presidente que mais polarizou a sociedade turca nas últimas décadas. O golpe de Estado de 2016 abriu um caminho para que ele pudesse concentrar mais poderes e eliminar adversários. Suas medidas cada vez mais autoritárias fizeram a população se dividir ideologicamente em dois polos: ser a favor ou contra Erdogan.
Adesão à União Europeia incerta
A Turquia tenta entrar na União Europeia desde 1963. No entanto, as negociações foram repetidamente suspensas devido a vários obstáculos, como reformas da administração pública e a garantia de políticas de direitos humanos.
Quando assumiu o governo, Erdogan realizou reformas que incluíam a concessão de direitos culturais à minoria curda, a abolição da pena de morte (exceto em caso de terrorismo) e alterações ao código penais, que buscavam se adequar a exigências de direitos humanos do bloco.
Após 2016, a deriva autoritária e repressiva do regime de Recep Tayyip Erdogan colocou em xeque a candidatura da Turquia para sua adesão. No entanto, a União Europeia reconhece os esforços da Turquia para receber cerca de 4 milhões de refugiados sírios.
Política externa firme
Erdogan também se destaca por conduzir uma política externa agressiva, colocando a Turquia como peça-chave na arena internacional e ganhando espaço como um influente ator regional.
A Turquia é um país da Europa e possui uma localização estratégica, próxima da Ásia e do Oriente Médio. É uma espécie de porta de passagem e de contenção de fluxos migratórios na região.
Vizinha da Síria, a Turquia ganhou protagonismo ao entrar na Guerra da Síria para combater o Estado Islâmico. No conflito, passaram a atacar grupos militares curdos, vistos como uma ameaça pelo governo turco. Erdogan busca controlar uma faixa de segurança na fronteira e garantir posições diante de uma divisão territorial depois da guerra.
A Guerra da Síria fez com que Erdogan se aproximasse da Rússia, que apoia o governo do presidente sírio, Bashar al-Assad. Com a inesperada aproximação com a Rússia, Erdogan incomodou os Estados Unidos.
A crise migratória provocada por conflitos no Oriente Médio pressionou a chegada de uma massa de refugiados à Turquia. Erdogan já ameaçou abrir as fronteiras para que imigrantes que se encontram em solo turco possam passar livremente para o território europeu. Para que isso não aconteça, ele exige a aprovação da União Europeia de medidas que permitem aos cidadãos turcos viajarem sem visto ao território comunitário.
O conflito sírio fez com que o governo turco também se visse como alvo de diferentes grupos terroristas. Diante do medo de um ataque, Erdogan fortaleceu o discurso de combate ao terrorismo. Segundo ele, é necessário um homem forte e centralizador para defender a Turquia de ameaças como o terrorismo do Estado Islâmico e de militantes curdos.
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