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Maio de 68 - 50 anos do movimento estudantil que mudou a França e a Europa

Imagem do livro Beauty Is In The Street sobre os protestos de 1968 em Paris, na França - Reprodução / "Beauty is in the Street" (Four Books Corners)
Imagem do livro Beauty Is In The Street sobre os protestos de 1968 em Paris, na França Imagem: Reprodução / "Beauty is in the Street" (Four Books Corners)

Por Carolina Cunha

O ano de 1968 ficou conhecido como aquele que não terminou. Diversos eventos e acontecimentos influenciaram o final do século 20 e ecoam até os dias de hoje. Em maio, completa-se 50 anos de um episódio emblemático: o Maio de 68 ou Maio Francês.

Após a Segunda Guerra Mundial, o mundo estava mergulhado na Guerra Fria e na experiência traumática com a bomba atômica. Os países estavam divididos em zonas de influência, lideradas por dois blocos: Estados Unidos (Capitalismo) e União Soviética (Socialismo), ambas com potentes arsenais nucleares.

Os anos 60 viu o aumento no número de jovens, devido à explosão demográfica do baby boom do pós-guerra. A juventude ansiava por mais liberdade e mudanças políticas. A luta pela igualdade de direitos civis, a contracultura, a liberação sexual, o reconhecimento da diversidade cultural e o pacifismo significavam mudanças de comportamentos que se chocavam com as gerações anteriores.

O contexto daquela época era de ebulição. Em 1968, a guerra do Vietnã viveu seu momento mais sangrento e protestos pediam a saída dos Estados Unidos do conflito e o retorno imediato das tropas. No mesmo ano, em abril, acontece o assassinato do líder negro Martin Luther King, símbolo da luta pelos Direitos Civis e da não-violência. E no Brasil, o governo sanciona o decreto do Ato Institucional nº 5 (AI-5), que endureceu a ditadura militar brasileira.

Dias de barricada na França

Na França, o clima também era de agitação. A França acabara de perder as colônias na África e na Ásia. Apesar da economia em crescimento, havia no ar um clima de insatisfação com a situação social e política do país.

O Maio de 68 foi um movimento marcado por uma grande onda de protestos que teve início com manifestações de estudantes para pedir reformas no setor educacional. A mobilização foi ampliada para outras pautas, como reformas estruturais do governo. 

O começo de tudo foi na Universidade de Paris, em Nanterre, cidade próxima à capital francesa. Em março, estudantes fizeram protestos pedindo melhorias na universidade e o campus foi ocupado pelos alunos. Era o Movimento 22 de Março, que seria a centelha que iria incendia o Maio de 68.

No dia 2 de maio de 1968, a reitoria decidiu fechar a escola e ameaçou expulsar estudantes. As medidas provocaram a reação imediata dos alunos de outras universidades, como a influente Sorbonne, em Paris. Eles se reuniram para protestar, saindo em passeata sob o comando do líder estudantil Daniel Cohn-Bendit. Os estudantes ocupam, depois, a Universidade da Sorbonne. A polícia reprimiu o ato com violência e o governo fecha a Sorbonne como medida de segurança.

Os protestos se intensificaram. Em 6 de maio ocorre o confronto entre 13 mil jovens e a polícia no Quartier Latin, bairro de Paris. Os policiais lançam bombas de gás lacrimogêneo, respondidas com pedras pelos jovens.  Durante vários dias as ruas de Paris viraram cenário de barricadas, incêndios e batalhas campais. Mas a reação brutal do governo para controlar a situação fortaleceu o apoio da sociedade aos estudantes.

Greve geral e renúncia do presidente

Os protestos cresceram e os universitários se uniram aos operários, sindicatos e movimentos de esquerda. No dia 13 de maio, 600 mil estudantes marcham nas ruas de Paris. Trabalhadores de toda a França decidem cruzar os braços, promovendo a maior greve geral da Europa, com a participação de dez milhões de pessoas (dois terços dos trabalhadores franceses).

As greves estudantis e operárias na França radicalizaram-se a ponto de colocar em crise a estrutura de poder e o governo do então presidente, Charles De Gaulle. Mesmo após tomar o controle da situação nas ruas, a pressão política fez De Gaulle dissolver a Assembleia Nacional e convocar eleições parlamentares antecipadas, o que aconteceu em 23 de junho de 1968. O general renunciaria um ano depois.

"É proibido, proibir”

O Maio de 68 também inovou na forma de comunicação e mobilização. Além de panfletos, os grupos criaram slogans como "É proibido proibir", "O poder está nas ruas" e "A imaginação no poder", que pediam mais liberdade. Os slogans eram pichados nos muros de Paris e por toda parte havia grafites de contestação.

“É proibido proibir” foi o lema central de Maio de 68, que se espalhou pelo mundo como um lema contra diversas formas de poder. No Brasil, a frase foi inspiração para uma música de Caetano Veloso.

Revolução ou utopia?

Ainda não existe um consenso sobre o que levou aqueles jovens às ruas. Muitos pensadores enquadram o Maio de 68 como “um delírio” ou “sonho” coletivo. Não havia uma reinvindicação política única, central e mobilizadora.O movimento aconteceu com força naquele ano e logo se dissipou. 

O filósofo francês Jean-Paul Sartre confessou, tempos depois, com perplexidade no que havia acontecido: “Nunca pude entender o que exatamente aqueles jovens queriam”. Para o psicanalista francês Jacques Lacan, os eventos explosivos de 1968 significavam o resultado de uma mudança na textura social e simbólica da Europa. O movimento estudantil contestava um estilo de vida que o mundo ocidental vivenciava no pós-guerra.

Mas qual seria o real legado do movimento? Além de resultados reais para aquela geração, Maio de 68 inaugura uma mudança radical na mobilização de direitos. Após esse ano, novos grupos e pautas surgiram, como movimento das mulheres, dos imigrantes e do meio-ambiente. Para o filósofo francês Alain Badiou, o episódio foi um final de uma época, que marcou o consumar-se definitivo de uma grande sucessão de revoluções políticas.

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