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Três poderes - Manifestações contra o Congresso: entenda como é dividido o sistema político no Brasil

Material publicitário que ataca Congresso e convidava para ato em 15 de março - reprodução
Material publicitário que ataca Congresso e convidava para ato em 15 de março Imagem: reprodução

Carolina Cunha

Colaboração para o UOL

Nos meses de fevereiro e março, o país foi tomado por debates em torno de protestos agendados por grupos que apoiam o governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) convocando a população para manifestações "pró-Brasil".

Na internet, algumas convocações pediam o fechamento do Legislativo e do Supremo Tribunal Federal (STF). Os grupos acusam esses poderes de impedirem Bolsonaro de governar.

A tensão entre bolsonaristas e o Congresso gerou crises no governo atual.

Ainda em fevereiro, o general Heleno, Ministro do Gabinete de Segurança Institucional, disse que o Executivo é vítima de chantagem de parlamentares sobre o controle do orçamento. Em 2019, o senador Eduardo Bolsonaro declarou em palestra que bastam um cabo e um soldado para fechar o Supremo Tribunal Federal.

Com o aumento dos casos de coronavírus no país, e em meio a dúvidas sobre a possível contaminação de membros da comitiva presidencial que foi aos Estados Unidos na última semana, os organizadores das manifestações decidiram cancelar os atos.

Deixaram, contudo, a reflexão sobre os limites do poder do presidente da República. Embora seja a maior autoridade do Brasil, não cabe a ele controlar o Poder Legislativo e o Poder Judiciário, ele precisa governar em harmonia com essas esferas.

Quais são os limites do poder do presidente?

Embora o Governo seja uno, o sistema político brasileiro é dividido em três poderes.

Segundo a Constituição Brasileira de 1988, compõem a República Federativa do Brasil os poderes Legislativo, o Executivo e o Judiciário. Eles são citados no segundo artigo como independentes e harmônicos entre si e devem trabalhar para o bem-estar comum da população brasileira.

A distinção entre as três funções estatais básicas — legislar, administrar e julgar — remonta à Grécia Antiga. O precursor da teoria da separação de poderes em corrente tripartite foi o filósofo grego Aristóteles.

O modelo foi retomado pelos iluministas, como o filósofo inglês John Locke (1632-1704) e pelo francês Montesquieu (1689-1755) que acreditava que ela impedia a concentração de poderes do absolutismo. O princípio foi adotado na Constituição de 1791 da França e inspirou as democracias modernas.

Por que existe essa separação?

Para uma democracia funcionar (ser estável) e um Estado não ser autoritário, as instituições precisam exercer suas atribuições. Cada poder possui determinadas características e responsabilidades. A separação existe para que não haja concentração de poder nas mãos de apenas uma pessoa ou um grupo.

E para que o sistema funcione, cada poder deve fiscalizar o outro e impedir que se cometa abusos ou eventuais excessos. É o chamado Sistema de Freios e Contrapesos, que consiste no controle do poder pelo próprio poder.

Dessa forma, o sistema de poderes possui mecanismos de controle de um poder sobre o outro, que podem evitar a superposição de um deles em relação aos demais.

Qual é o papel de cada poder no Brasil?

O Poder Executivo possui a função de executar as leis e administrar o Estado.

O Poder Executivo tem diferentes esferas nos níveis municipal, estadual e federal. Por exemplo, analisar as necessidades da população, criar serviços públicos, fazer a manutenção dos serviços já prestados, recolher e administrar impostos, entre outros.

Quem representa o nível federal do Executivo é o Presidente da República. O presidente é eleito por voto popular direto para um mandato de quatro anos e pode nomear os Ministros e cargos executivos de órgãos públicos.

No nível estadual, os governadores são os encarregados de administrar o respectivo estado. E no nível municipal, os prefeitos são os administradores.

O presidente executa e planeja o orçamento e políticas públicas e pode propor projetos de lei e emendas à Constituição Federal. Além disso, chefia as Forças Armadas e possui o poder de decretar intervenções nos estados brasileiros.

Ele também pode adotar medidas provisórias em casos de relevância ou de urgência. Ainda que esta MP tenha valor de lei, deve ser aprovada pelo Congresso Nacional.

Uma das maneiras do Executivo barrar normas do Legislativo é pela sanção ou pelo veto presidencial. A sanção presidencial significa que o presidente aderiu ao projeto de lei e entende que ele não vai contra a constituição ou é de interesse do país. O contrário da sanção é o veto, que significa que o presidente entendeu que a lei é inconstitucional ou vai contra os interesses do país.

Quem elabora as leis? E quem garante que sejam constitucionais?

Um país pode ter milhares de leis. Mas você já parou para pensar em como elas são feitas? O Poder Legislativo é quem faz as leis e/ou altera as leis nas esferas do Congresso Nacional (Senado e pela Câmara dos Deputados), Assembleias Legislativas (estados) e Câmaras de Vereadores dos municípios. Quem exerce os cargos são senadores e deputados (federais, estaduais e vereadores) eleitos pelo povo.

Também cabe ao Legislativo fiscalizar e controlar os atos do Poder Executivo, incluídos os da administração indireta.

O controle parlamentar da administração se efetiva por uma série de instrumentos, de acordo com os limites traçados pela Constituição. Dentre eles, são exemplos a convocação de autoridades para prestarem informações, requerimentos escritos de informações (por exemplo, prestação de contas e orçamentos) e aprovações e autorizações específicas para a prática de atos pelo Poder Executivo.

O Judiciário tem o poder de aplicar a lei nos casos concretos submetidos à sua apreciação e fiscalizar o seu cumprimento. Quem exerce o poder são juízes de várias instâncias. Ou seja, a justiça só se manifesta quando um cidadão, uma empresa ou um órgão público pede que ela julgue um caso.

A instância máxima do Poder Judiciário é o Supremo Tribunal Federal (STF). O STF é composto por 11 membros, que são indicados pelo presidente da República e passam pela aprovação do Senado Federal.

Os ministros são responsáveis pela guarda da Constituição Federal. Todas as leis precisam obedecer às regras da Constituição Federal.

É o Supremo quem diz se uma lei ou ato normativo é inconstitucional. Se os atos do Legislativo ou Executivo contrariarem a Constituição ou desrespeitarem algum direito fundamental, o Judiciário deve sair em defesa dos interesses da população e invalidar atos e leis do Congresso.

Diversas situações podem ter a sua constitucionalidade questionada em casos que serão julgados e interpretados pelo STF por votação. Por exemplo, o tribunal pode ter o poder de aceitar ou cancelar uma PEC (proposta de emenda constitucional) proposta por algum deputado.

Em alguns casos, o STF pode julgar algumas demandas da sociedade que "paralisam" no Congresso por diversos motivos, como o perfil ideológico das bancadas, porque o custo político pode ser alto ou porque existe uma minoria que não é representada pelos parlamentares (falta de representatividade parlamentar).

A segunda função importante do STF é na área penal. É o órgão quem julga os "crimes do alto escalão", nas infrações comuns, o Presidente da República, Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, entre outros.

Governabilidade do presidente e o Congresso

O sistema de governo atual do Brasil é o presidencialismo, no qual o presidente é, ao mesmo tempo, chefe de Estado e chefe de governo. Ele monta o governo como julga mais adequado e de acordo com suas alianças.

No presidencialismo, o presidente, em teoria, pode governar sozinho. Ou seja, pode governar sem a maioria parlamentar do Congresso Nacional eleito pelo povo. No entanto, o presidente depende do apoio da maioria do Legislativo para se manter no cargo com estabilidade e ter suas propostas realizadas.

No Brasil, o Congresso possui muita força pois quase toda política pública precisa de leis para serem instituídas. Dessa forma, para conseguir governar, o presidente deve realizar uma articulação política e montar uma coalisão parlamentar de apoiadores do Governo.

Outros dois papeis importantes são os de presidente da Câmara dos Deputados e presidente do Senado. Uma das funções desses cargos é definir a ordem de prioridades para votação de projetos, por isso o parlamentar tem poder para acelerar ou atrasar a votação de propostas de interesse do Executivo.

No caso do Brasil, um país com muitos partidos políticos, o presidente precisa ter muita habilidade política para costurar o apoio no Congresso. O apoio de alianças pode ser feito de diversas formas, com base em programas, princípios, valores e a participação das bases no Governo.

Em 1988, o sociólogo Sérgio Abranches cunhou o termo "presidencialismo de coalizão" para descrever arranjos do sistema político brasileiro. O conceito se refere a um tipo de presidencialismo no qual o presidente não consegue fazer maioria com o seu partido no Congresso.

Ele precisa de outros partidos para alcançar maioria e governar, ou seja, precisa de uma coalização multipartidária. Dessa forma, deputados filiados aos partidos que fazem parte da coalizão de apoio ao presidente seguem a recomendação de voto do líder do governo.

Caso o presidente não consiga apoio, isso não significa perda de seu cargo ou paralisia de projetos legislativos, mas significa que o Congresso pode bloquear a agenda presidencial e seguir uma "agenda própria".

Em momentos de crise política grave, a falta do apoio parlamentar pode gerar paralisia no país (ao travar a agenda do presidente) ou levantar questões éticas, como a "cooptação" de deputados a qualquer custo, o que abre margens para chantagens e a corrupção.

Cientistas políticos avaliam que, para um Congresso se tornar mais equilibrado, é preciso uma boa coordenação política entre os poderes Executivo e o Legislativo, ou seja, uma boa base de diálogos e negociações.

Um número menor de partidos também poderia evitar uma fragmentação muito alta. Mas mesmo com um número alto de partidos, um "pacto" entre as bases poderia evitar possíveis crises e manter a aprovação de projetos que interessem ao governo.

Para alguns críticos, a instituição do parlamentarismo no Brasil seria uma solução para crises institucionais e para o "vale tudo" na barganha entre Legislativo e Executivo.

No parlamentarismo, o presidente exerce o cargo de chefe de Estado, mas cabe ao primeiro-ministro a gestão da máquina administrativa.

Uma diferença fundamental entre os dois sistemas é método de escolha do chefe do governo: o presidente é eleito pelo voto popular. Já o primeiro-ministro é geralmente escolhido pelos parlamentares.

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