Estado Islâmico - Jovens ocidentais são atraídos para o terrorismo na Síria e Iraque
A ofensiva anunciada pelo presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, contra o Estado Islâmico (EI) no Iraque endossou a visão de outros governos ocidentais a respeito do grupo extremista: eles são a maior ameaça à segurança nacional desde o surgimento da Al Qaeda, de Osama Bin Laden. O motivo? Pregam uma nova forma de terrorismo sem fronteiras e estão atraindo a atenção de muitos jovens muçulmanos ocidentais, dispostos a se alistarem ao grupo.
Em sua origem, o Estado Islâmico nasceu no Iraque, em 2003, e atuava como um braço da Al Qaeda. Após romperem relações, em 2013, o EI se juntou a um grupo jihadista sírio, criando o Estado Islâmico do Iraque e Levante, ISIS (Islamic State of Iraq and the Levant) na sigla em inglês. Presentes na Síria e Iraque, os militantes jihadistas buscam instalar um Estado pan-islâmico.
Islamismo e grupos radicais
O Islamismo se refere a diversos tipos de ativismo político do mundo mulçumano. Existe uma variedade de correntes ideológicas islamistas contemporâneas, entre moderadas, extremistas e religiosas. Todas buscam a construção de um Estado islâmico, tendo a religião Islã como elemento fundamental da política e da vida social.
Desde o início do século 20, após a independência dos países árabes da colonização europeia, diversos grupos fundamentalistas islâmicos surgiram e muitos se organizaram militarmente. Alguns deles são classificados pelos EUA como terroristas. No Egito, o movimento Irmandade Mulçumana, fundado em 1928, é considerado por muitos analistas como o precursor do islamismo militante moderno e disputou eleições legislativas.
No Irã, a revolução xiita de 1979 levou o líder religioso Khomeini a se tornar o Líder Supremo de uma nação teocrática. No Líbano, em reação à invasão ao país por Israel nos anos 1980, o grupo armado xiita Hezbolhah fez uso de ataques suicidas e sequestros. Em 1996, no Afeganistão, a milícia radical do Talibã utilizou táticas de guerrilha e ataques de homem-bomba para tomar o poder.
Na Palestina, o grupo Hamas é reconhecido pelas práticas violentas pela independência da região e foi considerado o primeiro grupo islâmico no mundo árabe a conquistar o poder democraticamente. Outro grupo militante palestino é o Jihad Islâmico, apontado como o grupo armado palestino mais radical e que cometeu diversos atentados terroristas contra Israel. Surgiu na década de 1970 e considera a luta contra os israelenses como uma Guerra Santa.
Apesar de táticas parecidas, esses grupos sempre tiveram uma atuação mais local do que internacional. A partir da década de 1990, no contexto da globalização, um novo tipo de fenômeno emerge: o terrorismo transnacional, relacionado à ascensão da organização terrorista conhecida como Al-Qaeda, fundada por Osama Bin Laden e que pregava uma luta contra o Ocidente. Os jihadistas ganharam maior visibilidade após os ataques de 11 de setembro de 2001, quando militantes da Al-Qaeda lançaram aviões contra o World Trade Center, em Nova York, e com a posterior invasão do Iraque pelos EUA, em 2003.
O jihadismo
Uma das correntes mais radicais e com maior visibilidade é a jihadista, que acredita que a sociedade mulçumana foi corrompida pela modernidade e pelos valores morais do Ocidente e por isso é necessário um retorno ao Islã original da época de Maomé.
Ela não acredita na luta político-partidária ou na participação nas instituições políticas tradicionais, pois não estariam de acordo com a sharia, o conjunto de leis baseadas na interpretação do Alcorão (o livro sagrado do Islamismo) e na vida do profeta Maomé, o fundador do Islã.
Os jihadistas consideram o jihad como uma obrigação de qualquer mulçumano, onde a violência e a luta armada seria um recurso legítimo. Na interpretação desses grupos, o jihad seria uma obrigação individual dos militantes, uma revolução permanente contra os inimigos do Islã e os governantes infiéis.
Os jihadistas do Jihad Islâmico do Egito, por exemplo, buscam derrubar o governo e formar um estado islâmico no país. Já os jihadistas do EI buscam restaurar um califado (tradicional sistema de governo árabe) com caráter global e que unificaria as terras mulçumanas, tendo o Ocidente como inimigo. Também querem impor à sociedade o que consideram o modo de vida verdadeiramente islâmico.
Existe uma corrente chamada “salafismo jihadista”, que foi idealizado por Abu Muhammad al Maqdisi e por Abu Qatada al Filistani, na Londres islâmica dos anos 1990. Maqdisi a descreve como sendo um movimento global que admite a existência de diversas frentes jihadistas, como no Afeganistão, Bósnia e Chechênia. Ele foi mentor espiritual de Abu Musab al Zarqawi, um dos fundadores da Al Qaeda no Iraque e que influenciou os militantes do EI.
O termo árabe “jihad” está presente no Alcorão e significa um esforço no caminho de Deus. Os teólogos mulçumanos dividem a jihad em dois tipos: o esforço individual de luta contra si mesmo para conquistar um bom caminho espiritual e a luta para levar o Islã para outras pessoas. Segundo o Alcorão, quem entrar nessa luta participará da felicidade no paraíso.
A palavra é frequentemente associada à “Guerra Santa”. Isso porque ao apelo do jihad, pode-se adotar a defesa ou o ataque militar para instaurar a Lei de Deus contra os inimigos. É nessa corrente que o islamismo violento se instaura.
Um termo muito usado pelos radicais é a palavra “mujahidin”, que se refere a “aquele que busca o jihad”, combatentes dispostos ao sacrifício da própria vida em nome de Deus. Segundo o Alcorão, o guerreiro que se entregasse ao martírio alcançaria a glória da morte em combate e seria recompensado com a benção e o paraíso.
A associação do termo à guerra pelos extremistas é criticada por muitos mulçumanos como uma interpretação errada do conceito. Para alguns líderes religiosos, existem regras do que seria um jihad justo e ela também poderia acontecer por meios pacíficos, sendo que o Islã jamais aceitaria a morte de inocentes ou atos de crueldade.
Bin Laden e o jihadismo transnacional num mundo globalizado
A segunda geração de jihadistas, dos anos 2000, foi inspirada pela ideologia terrorista de Bin Laden, mas eles não necessariamente fazem parte da rede. Existem diversos grupos e células dispersas, muitas com autonomia e sem qualquer ligação entre si, mas que têm como referência comum o ideal do Jihad e a volta a um passado mítico. Existem também os jihadistas “solitários”, seduzidos pela ideologia, mas que não fazem parte de nenhum grupo.
Hoje, os combatentes e militantes são formados por pessoas de diferentes nacionalidades, atraídas pelo discurso antiocidental e que estão dispostas a se colocarem a serviço de um nova guerra santa em qualquer lugar do mundo. Na Chechênia, província da Rússia de maioria mulçumana sunita, durante o conflito das duas guerras para a separação (1996 e 1999), jihadistas islâmicos estrangeiros ligados à Al-Qaeda viajaram ao país em apoio aos rebeldes, na tentativa de instaurar um estado islâmico.
A recente guerra civil da Síria, que se iniciou em 2011, com protestos da população contra o regime do presidente Bashar al-Assad, ganhou o apoio de milhares de jovens estrangeiros jihadistas. São homens (e também mulheres) que entraram ilegalmente pela fronteira síria para lutar no país ao lado dos rebeldes.
Diversos grupos extremistas viram o conflito como uma oportunidade para derrubar o Estado e, posteriormente, impor a islamização a toda a sociedade. Na Síria, grupos radicais islâmicos já cometeram inúmeras atrocidades e controlam territórios onde governam através de tribunais da Sharia.
Muitos dos jihadistas estrangeiros que lutaram ao lado dos rebeldes sírios foram para o Iraque e se juntaram às brigadas do Estado Islâmico, que tomou grande parte do território norte e oeste do país. O grupo extremista autoproclamou um Califado e aspira tomar o território de outros países islâmicos, a começar pelo Oriente Médio. Outros possíveis alvos seriam os EUA e países da Europa.
Segundo dados do Observatório Sírio para os Direitos Humanos, com sede em Londres, o EI contaria hoje com um exército de 50.000 homens apenas na Síria. Desses, 20.000 seriam estrangeiros, principalmente de outros países árabes, do Norte da África e da Europa. Outros 30.000 homens no Iraque completam o efetivo.
Os números são imprecisos. Os EUA calculam em cerca de 2 mil o número de combatentes ocidentais na Síria, incluindo mais de 200 norte-americanos. A França estima que mais de mil franceses tenham se juntado ao Estado Islâmico na Síria e Iraque. O Reino Unido contabiliza pelo menos 500 britânicos que viajaram para os dois conflitos e a Austrália, cerca de 60 cidadãos. A Alemanha relatou a ida de 60 alemães para o Egito depois de treinados na Somália.
A maioria desses jovens ocidentais são filhos ou netos de mulçumanos. Analistas avaliam que o racismo, o desemprego e a crise de identidade influenciam jovens mulçumanos a buscar o jihadismo. Atraídos pela propaganda dos militantes por um novo caminho de vida, eles são recrutados por amigos próximos e pela internet, em fóruns virtuais e redes sociais. Ingleses chegaram a postar selfies e fotos do front de batalha na Síria, vangloriando-se de seus “feitos” como se fossem atos heroicos.
Foi justamente o reconhecimento do sotaque britânico de um jihadista que aparece no vídeo da execução de um jornalista por militantes do EI que gerou o sinal de alerta sobre o alistamento de estrangeiros no grupo. Divulgado em agosto deste ano, o chocante vídeo mostra a decapitação do norte-americano James Foley. Segundo o serviço secreto britânico, o algoz do jornalista seria um cidadão britânico.
A atuação radical do Estado Islâmico no Iraque não é reconhecida por países do Oriente Médio como Líbano, Jordânia, Irã e Arábia Saudita. O autodeclarado Califado no território iraquiano é visto como uma ameaça à segurança por esses países e também por comunidades muçulmanas moderadas.
Embora alguns desses jovens estrangeiros tenham manifestado o desejo de sair do grupo, os países temem que os combatentes que voltarem pra casa cometam atos terroristas. No início de setembro, especialistas do King's College, em Londres, sugeriram que o governo britânico iniciasse um "programa de desradicalização" já que alguns cidadãos britânicos teriam se mostrado arrependidos de se juntar ao ISIS e manifestaram vontade de retornar ao seu país. No entanto, o primeiro-ministro britânico David Cameron propõe condenar por cerca de 30 anos quem estiver ligado ao grupo extremista.
DIRETO AO PONTO
A recente guerra civil da Síria, que se iniciou em 2011, com protestos da população contra o regime do presidente Bashar al-Assad, ganhou o apoio de milhares de jovens estrangeiros jihadistas que entraram ilegalmente pela fronteira síria para lutar no país ao lado dos rebeldes.
Diversos grupos extremistas viram o conflito como uma oportunidade para derrubar o Estado e, posteriormente, impor a islamização a toda a sociedade. Na Síria, grupos radicais islâmicos já cometeram inúmeras atrocidades e controlam territórios onde governam através de tribunais da Sharia.
O principal grupo e o mais violento é o Estado Islâmico (EI), que tomou partes do território do Iraque, autoproclamou um Califado no país e aspira invadir o território de outras nações islâmicas.
A maioria desses jovens ocidentais que viajam para a Síria e Iraque para lutar são filhos ou netos de mulçumanos. Analistas avaliam que o racismo, o desemprego e a crise de identidade faz com que muitos jovens mulçumanos sejam presos fáceis para o jihadismo. Atraídos pela propaganda do EI e por um novo caminho de vida, eles são recrutados pela internet e estão dispostos a ingressar em uma nova jihad em qualquer lugar do mundo. O fenômeno têm preocupado os EUA e países da Europa, que temem uma onda de ataques terroristas.
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