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40 anos do fim do franquismo - Ditadura marcou o século 20 na Espanha

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Imagem: Reprodução

Carolina Cunha

Da Novelo Comunicação

Pintado em 1937, o painel “Guernica” (imagem acima) é uma das obras mais famosas do pintor espanhol Pablo Picasso e tornou-se símbolo de um importante momento histórico para a Espanha e sua democracia. A obra representa de forma artística o sofrimento do povo de Guernica e dos espanhois, vítimas dos horrores da Guerra Civil Espanhola (1936-1939). No conflito, a cidade basca foi bombardeada por aviões alemães que apoiavam o general Franco.

A guerra civil fez mais de 500 mil vítimas na Espanha e abriu caminho para a ascensão do Franquismo (1939-1975), regime totalitário e de extrema direita.

Em novembro de 2015, o fim do regime franquista completa 40 anos. Depois de 1975 a democracia foi restaurada e atualmente o país vive uma monarquia parlamentar. Mas os anos traumáticos sob uma ditadura marcaram toda uma geração.

Guerra civil espanhola

A Guerra Civil Espanhola foi um conflito militar entre os nacionalistas e os republicanos durante o período de 1936 a 1939. Ela foi uma consequência da briga de classes numa Europa devastada após a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), mas também é vista como o balão de ensaio da Segunda Guerra Mundial, pois antecipou a polarização entre diferentes forças do continente.

A origem do conflito remonta a 1931. Naquele ano, rebeldes derrubaram a monarquia espanhola e proclamaram a República. Eleito democraticamente, o novo governo era liderado pela Frente Popular, coalisão formada por partidos da esquerda com quadros socialistas, comunistas e liberais.

O governo prometia uma política de inclusão social com medidas polêmicas para a época, como a reforma agrária, Estado laico, anistia a presos políticos, campanhas de alfabetização de camponeses e a emancipação das mulheres.

Mas a instabilidade política e social era grande. Greves de trabalhadores e movimentos separatistas começaram a emergir. A economia estava estagnada e ainda havia a polarização ideológica entre o fascismo e comunismo.

Temendo uma revolução social e buscando o poder político, alas da direita se organizaram para derrubar o novo governo de esquerda em um golpe de Estado que contou com o apoio da elite, monarquistas, da Igreja Católica e do exército.

A Falange era um partido fascista que se definia como nacionalista e tinha como líder o general Francisco Franco (1892-1975). Os falangistas eram contra o novo governo e se alinhavam ao pensamento conservador e de extrema-direita.

Em 1936, as forças armadas de Franco tomaram várias cidades. A guerra civil eclodiu com muita violência. Homens, mulheres e crianças pegaram em armas e construíram barricadas nas cidades. O conflito atraiu voluntários provenientes de vários países que lutaram em ambos os lados.

Do lado da esquerda, os voluntários formaram as Brigadas Internacionais, unidades de combatentes que tinham como principal objetivo a luta contra o fascismo franquista e a defesa da democracia e da República espanhola.

As Brigadas Internacionais eram formadas por mais de 40 mil voluntários de várias nacionalidades dispostos a lutar. Esses grupos também tinham apoio da União Soviética. Já as tropas franquistas contaram com o apoio militar dos governos autoritários de Oliveira Salazar (Portugal) e as potências do Eixo: a Alemanha, de Adolf Hitler, e a Itália, de Mussolini.

Em 1937 aconteceu o trágico bombardeio de Guernica, que contou com ataques de aviões nazistas alemães.

Com a vitória dos nacionalistas na Guerra Civil, os militares e a direita radical subiram ao poder. A ditadura de Francisco Franco começou em abril de 1939. Ele instituiu um regime de partido único e que concentrava todos os poderes políticos, governando com mãos de ferro os poderes Executivo, Legislativo e o Judiciário.

A liberdade de pensamento foi pouco a pouco suprimida. O Estado intensificou a repressão contra oposicionistas e simpatizantes da República Espanhola e estimulou a propaganda patriótica e anticomunista. Em propagandas oficiais, para mobilizar a opinião pública Franco era saudado como um mito, um “herói de guerra”, “salvador da Espanha” e “sentinela do Ocidente”.

Durante o período de 1936 a 1975, estima-se que mais de 114 mil pessoas foram consideradas desaparecidas. Houve denúncias da existência de campos de concentração para adversários políticos de Franco e o medo era constante na sociedade.

Apesar de manter a Espanha neutra na Segunda Guerra Mundial, Franco enviou soldados para apoiar os alemães na invasão da União Soviética, em 1941. Com a derrota da Alemanha, o país ficaria isolado na Europa nas próximas duas décadas.

Já no contexto da Guerra Fria, Franco se reaproxima dos Estados Unidos e dos países europeus que não interferiram na política da Espanha e aceitaram o governo franquista como aliado contra o comunismo.

Em 1969, Franco decide nomear Juan Carlos seu sucessor, baseando-se na Lei de Sucessão. Juan Carlos era neto do antigo rei Alfonso XIII e ao longo dos anos foi sendo preparado pelo governo para assumir o futuro cargo. Em 1975 Franco falece, colocando o ponto final no franquismo.

Após a morte do ditador, Juan Carlos assume oficialmente como rei e começa um processo pacífico de liberalização no país, anistiando presos políticos e iniciando a transição para a democracia dentro de um sistema de monarquia parlamentarista.

A transição do regime autoritário do Franquismo para a democracia realizou-se na década de 1970, período de profundas mudanças e de fortalecimento da sociedade civil.

Dois anos após a morte de Franco, em 15 de junho de 1977, foram realizadas as primeiras eleições livres na Espanha após a Guerra Civil de 1939. Já em 1978 foi promulgada uma nova Constituição.

O franquismo foi uma ferramenta de fortalecimento do nazi-fascismo na Europa. Em 2006, a Corte Espanhola e o Parlamento Europeu condenaram o regime alegando haver provas de que ele violou direitos humanos. Qualquer manifestação de apoio ao franquismo ficou proibida no país a partir do mesmo ano. Nenhuma das duas medidas conteve o avanço da extrema-direita na Europa, com partidos cada vez mais atuantes e propostas conservadoras.

Quanto ao quadro de Picasso, uma das obras mais conhecidas em todo o mundo, ela permaneceu muito tempo em Paris, já que, pela vontade do artista, ela só deveria retornar à Espanha quando o país voltasse a ser uma democracia. Hoje Guernica encontra-se no Museu Nacional Centro de Arte Reina Sofia, em Madri.

BIBLIOGRAFIA

Guernica - A História de um Ícone do Século XX, Gijs Van Hensbergen (José Olympio Editora) 

Era dos Extremos: o breve século XX : 1914-1991, Eric Hobsbawm (Companhia das Letras)

A Guerra Civil Espanhola, Josep M. Buades (Contexto)

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