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100 anos da Revolução Russa - entenda o contexto e as consequências da guerra civil russa

Ivan Sekretarev/AP
Imagem: Ivan Sekretarev/AP

Por Carolina Cunha, da Novelo Comunicação

Em 2017, completa-se 100 anos da Revolução Russa, um dos principais movimentos revolucionários do século 20.  Ela consiste em uma série de conflitos que culminou na derrubada do Império Czarista em 1917. A revolução produziu o primeiro regime comunista da história e se tornaria o principal acontecimento político do século 20.

As origens da Guerra Civil na Rússia

Entre os anos de 1613 a 1917, a Rússia estava sob o domínio do Império Czarista. Vários membros da dinastia Romanov se sucederam no trono como czares (imperadores). O Império Russo tinha dimensões continentais. Seu território abrangia partes da Europa e Ásia e abrigava uma grande diversidade de povos. 

A estrutura social do Império Russo se caracterizava por ser arcaica e autocrática. Em 1897, havia 126 milhões de habitantes e 80% dessa população era formada por camponeses. A elite contava com os clérigos da Igreja ortodoxa, os militares e uma pequena nobreza agrária.

Durante o século 19, a atrasada Rússia começou um processo de industrialização e investiu no crescimento econômico, com a construção de ferrovias e a produção de aço e carvão. Nas cidades, formavam-se novos grupos sociais, como empresários e operários. Após a abolição da servidão no campo (1861), milhares de camponeses migraram para os centros urbanos.

A partir de 1900, o sentimento de insatisfação com o governo era crescente. No campo, os impostos elevados e a grande quantidade de camponeses sem-terra aumentava a insatisfação. Nas cidades, os empresários emergiam com um novo poder econômico, porém, não tinham espaço político. Os operários enfrentavam longas jornadas de trabalho e baixos salários. Nesse contexto, crescia o movimento comunista e sindical.

Crise no governo do czar Nicolau II

Em 1904, começou uma série de protestes e greves nas cidades e centros industriais, pedindo reformas políticas e melhores condições de trabalho. Alguns líderes socialistas procuraram mobilizar a população contra o Império. No mesmo ano, a Rússia quis expandir os domínios do Império e entrou em guerra com o Japão, na disputa dos territórios da Coreia e da Manchúria. O conflito não conquistou o apoio da maioria da população.

Para sair da crise, Nicolau II anunciou algumas medidas como a tolerância religiosa e a liberdade de imprensa. No dia 22 de janeiro de 1905, trabalhadores marcharam em direção ao Palácio, em São Petersburgo, para pedir uma audiência com o czar. Havia uma multidão de pessoas em uma manifestação pacífica. A reação do governo foi violenta e resultou na morte de centenas de pessoas, no episódio conhecido como “Domingo Sangrento”. O massacre resultou em novos protestos e o czar passou a ser visto como inimigo do povo.

Greves gerais e levantes militares ocorreram em toda Rússia. Lideranças foram presas e enviadas para campos forçados. Na clandestinidade, foram criados diversos novos partidos e organizações ligadas ao comunismo.

Em 1903, o então Partido Operário Social-Democrata havia se dividido em dois blocos: o menchevique, liderado por Georgi Plekhanov, e o bolchevique, cuja liderança era Lênin.  “Operários e camponeses da Rússia, vocês não estão sozinhos! Se conseguirem derrubar, esmagar e destruir os tiranos da Rússia feudal, policiada pelos senhores e czarista, sua vitória servirá como sinal para uma luta mundial contra a tirania do capital”, discursa Lênin, em 1905.

Outro episódio marcante foi a revolta do Encouraçado Potemkin, movimento dos marinheiros russos. Em 1905, marinheiros de um navio do Czar se revoltam contra seus comandantes e assumem o controle. A população de Odessa apoia o levante e as forças do regime czarista massacram o movimento.

Pouco depois, termina a Guerra Russo-Japonesa, com acordo de paz assinado em setembro de 1905. Os russos foram derrotados e cederam territórios aos opositores. O conflito foi considerado pelos russos como humilhante e abalou ainda mais o regime político do Czar Nicolau II. Foi a primeira vez na história que um país europeu foi derrotado por uma nação asiática. 

O Império Russo vivia novamente uma ebulição social. Com o Manifesto de Outubro, o czar fez uma reforma política na qual abria mão de poderes absolutos, permitindo a formação de uma monarquia constitucional e a criação da Duma, o Parlamento russo. Mas o Czar continuou a centralizar decisões e o parlamento teve pouca representatividade. 

O início da Revolução

Em 1914, o mundo viu eclodir a Primeira Guerra Mundial, que contou com a participação da Rússia. O desgaste foi grande: cerca de 1,5 milhão de soldados russos morreram, a inflação subiu e a produção de alimentos despencou. Uma nova onda de manifestações populares eclodiu reivindicando melhores condições de vida e a saída da Rússia do conflito. O clima era de insurreição e regime ficou ainda mais enfraquecido.

Em fevereiro de 1917, São Petersburgo vive uma crise de abastecimento. O governo instituiu o racionamento de alimentos e a população, revoltada, decide iniciar uma greve geral e manifestações. Tropas do governo aderiram aos levantes e em poucos dias, conseguem derrubar o Império. O czar Nicolau II é obrigado a renunciar e o Parlamento cria um governo provisório.

A vitória do socialismo

Iniciada pela população de forma espontânea, a revolução teria novos capítulos e abriria caminho para o socialismo. O governo provisório, formado por membros da elite, vislumbrava uma Rússia moderna e capitalista. Mas os movimentos sociais pressionavam por medidas urgentes como a reforma agrária, o combate ao desemprego e o fim da fome que assolava o país.

Nesse contexto, os sovietes, conselhos democráticos formados por trabalhadores, começaram a formar um poder paralelo e a ter um papel fundamental na consolidação do socialismo no país. No campo, os trabalhadores ocuparam terras de latifundiários. Nas fábricas, eles passaram a gerir e a controlar a produção, expulsando os proprietários.

Diante de novos tumultos, os bolcheviques passaram a apoiar as mobilizações dos sovietes e ganharam o apoio da população. Eles tomariam o poder em outubro de 1917, com a Revolução Bolchevique. Isso aconteceu após as tropas dos sovietes (camponeses socialistas que viraram soldados) derrubarem o governo provisório e colocarem Lênin no comando. 

Os primeiros atos desse governo foram a retirada da Rússia da Primeira Guerra Mundial e o início de uma ampla reforma agrária, com a criação de fazendas coletivas. As propriedades, os comércios e a indústria passaram a ser organizadas pelo Estado.

Em 1918 é criado o Exército Vermelho e unidades de polícias especiais, como a Tcheka, que exerciam o papel de promover a estabilidade do novo governo socialista, evitar uma insurreição operária e combater milícias anticomunistas, como o Exército Branco, patrocinado por oposicionistas e países estrangeiros.

Nesse período, muitos “inimigos do Estado” morreram fuzilados, greves foram reprimidas e jornais de oposição foram fechados. Um episódio polêmico foi a decisão de Lênin de confiscar grãos de camponeses que seriam destinados à manutenção dos trabalhadores nas cidades. Mas as cotas para evitar o desabastecimento urbano eram acima da capacidade de produção. Com essa medida, a produção de cereais começou a cair. Entre 1921 e 1922, houve uma grande crise de fome no campo, que deixou milhares de mortos.

Com medo de que o socialismo russo pudesse influenciar outros países, as potências capitalistas procuraram isolar a União Soviética, numa política conhecida como “cordão sanitário”, que consistia em embargos de comércio. Para contornar a situação, Lênin implementa a NEP (Nova Política Econômica), uma série de medidas para estimular a economia. Ele obteve êxito e houve grande avanço na indústria, comércio e agricultura. 

Em 1922 é fundada a
União Soviética, fruto da junção de 15 repúblicas com governo e economia centralizados na Rússia. Após Lênin falecer, em 1924, Joseph Stálin assume a liderança do Partido Comunista e passa a atuar com mão de ferro. Seu governo é marcado por um forte crescimento econômico e investimentos na indústria, levando a União Soviética a se tornar uma potência mundial.

Apesar dos avanços econômicos, o regime de Stálin foi marcado por medidas repressivas contra os opositores. A falta de liberdade refletia um governo totalitário, com base em um partido único e centralizado. Durante o período, vários opositores foram mandados para os gulags, campos de trabalho forçado localizados em regiões geográficas isoladas, como a Sibéria. Estima-se que mais de cinco milhões de pessoas foram vítimas do stalinismo.

A Guerra Fria

Após a Segunda Guerra Mundial, o mundo passou a viver uma nova divisão de poder. Era o nascimento da Guerra Fria, época marcada pela tensão permanente entre duas superpotências: a União Soviética (comunista) e os Estados Unidos (capitalista).

As superpotências passaram a ser inimigas e dividiram o mundo em dois blocos, tendo como pano de fundo o conflito ideológico entre capitalismo e comunismo.  Mas a luta não seria combatida numa guerra comum. Ele aconteceria na esfera social, econômica e política.

A União Soviética e os Estados Unidos passaram a disputar zonas de influência e buscavam estabelecer alianças com o maior número possível de países. Por possuírem a tecnologia das bombas atômicas, as superpotências limitavam as ações militares, ao mesmo tempo em que estimulavam uma corrida armamentista e tecnológica.  

Em 1961 foi criado o muro de Berlim, que estabelecia a divisão da Alemanha em duas partes: Oriental e Ocidental. A área foi apelidada de “Cortina de Ferro” e dividia simbolicamente os países europeus sob a influência das duas superpotências.  Moscou exercia o seu poder no leste europeu e os Estados Unidos nos países ocidentais.

O colapso da União Soviética

Na década de 1980, Mikhail Gorbachev, líder soviético, buscou reformar a União com a introdução das políticas glasnost e perestroika. Ele buscava estimular a economia e realizar uma maior abertura política. No entanto, as reformas levaram ao surgimento de movimentos nacionalistas e separatistas.

A queda do muro de Berlim, em 1989, simbolizou o fim da Guerra Fria e do regime socialista na Alemanha Oriental. Na época, muitos opositores declararam que o “sonho tinha acabado” e que esse seria o ponto final do socialismo como alternativa de poder. Gradualmente, todos os países da Europa Oriental abandonaram o regime comunista e passaram a adotar a economia de mercado.

Gorbachev renuncia em 1991, num processo que dá início ao desmantelamento da União Soviética. O colapso da URSS levou à criação da Comunidade dos Estados Independentes (CEI), formada pela Armênia, Azerbaijão, Bielorrússia, Cazaquistão, Quirguistão, Moldávia, Rússia, Tajiquistão, Turcomenistão, Ucrânia e Uzbequistão. Logo depois, quase todas as repúblicas se tornaram independentes e adotaram a economia de mercado. 

A Constituição de 1993 declara a Rússia uma República Democrática Federativa, com o Estado dividido nos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. Apesar disso, alguns cientistas políticos não consideram o país uma democracia plena, baseados em critérios como restrições à liberdade de manifestação, falsificação de eleições e a existência de poucos partidos de oposição.

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