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Racismo - Crime inafiançável e ideologia sem fundamento científico

Antonio Carlos Olivieri, Da Página 3 Pedagogia & Comunicação

A eleição de Barack Obama - aclamado internacionalmente como o primeiro negro a alcançar a presidência dos Estados Unidos -, o dia nacional da consciência negra - comemorado a 20 de novembro -, e a própria polêmica sobre as cotas raciais para ingresso nos cursos universitários no Brasil - que motivou abaixo-assinados pró e contra a iniciativa -, tornam oportunas algumas informações históricas e científicas sobre o racismo.

A Constituição brasileira de 1988, em seu artigo 5º, inciso 42, tornou a prática do racismo um crime inafiançável e imprescritível entre nós. A essência desse crime é a discriminação racial, ou seja, o tratamento pior ou injusto dado a alguém por causas de características pessoais, como a cor da pele, que é o exemplo mais evidente na sociedade brasileira. O fundamento do racismo é o preconceito, uma opinião ou julgamento de valor arbitrário e sem base objetiva.

No entanto, ao longo da história, o racismo procurou se estabelecer como uma doutrina filosófica com fundamentação científica. Seu primeiro teórico foi o conde Joseph Arthur de Gobineau (1816-1882), um diplomata e escritor francês, autor de um "Ensaio sobre a desigualdade das raças humanas", obra que visava a defender uma concepção aristocrática da sociedade, contra os avanços democráticos que se manifestavam no século 19.



Raça ariana

Gobineau postulava a existência de uma raça humana superior, a raça ariana ou nórdica, que, durante a Antiguidade, teria se difundido a partir do Norte da Europa, espalhando-se pela Grécia e Roma, e dando origem às primeiras civilizações. Os arianos seriam, no entender de Gobineau, os responsáveis por todas as manifestações positivas, benéficas ou elevadas da humanidade. Ainda segundo ele, foi a mistura dos nórdicos com raças inferiores que provocou a decadência das civilizações antigas.

Vale a pena lembrar que Gobineau, como diplomata, serviu em muitos países, entre os quais o Brasil. Chegou ao Rio de Janeiro em 1869 e tornou-se amigo do imperador Pedro 2º, embora este não compartilhasse plenamente de suas ideias racistas. Apesar de manter uma correspondência com dom Pedro mesmo depois de ter deixado o país, Gobineau abominou o Brasil, que considerava uma nação sem futuro, já que marcado pela forte presença de raças inferiores.



Alemanha nazista

No início do século 20, Houston Stewart Chamberlain (1855-1927), um inglês naturalizado alemão, difundiu o pensamento arianista na Alemanha, identificando os alemães com a raça superior. Suas ideias encontraram solo fértil naquele país, onde o anti-semitismo havia se arraigado desde a Idade Média, e serviram de base para o nazismo, cuja doutrina racial foi elaborada pelo político e escritor Alfred Rosenberg (1893-1946).

Conselheiro de Adolf Hitler e ministro da Alemanha nazista, Rosenberg foi pessoalmente responsável pela deportação e o extermínio de centenas de milhares de judeus, durante o Holocausto, pelo que foi condenado à forca por crimes de guerra num julgamento dos tribunais de Nuremberg, realizados ao fim da Segunda Guerra Mundial. Suas ideias adequaram o pensamento de Gobineau e Chamberlain aos objetivos políticos do nazismo, apresentando os judeus como uma raça parasitária e oposta à ariana.

Nessa perspectiva, os judeus eram responsabilizados por tudo que o nazismo condenava, como o capitalismo, a democracia, o marxismo e até os ideais de amor e humildade cristãos, que seriam uma deturpação dos ensinamentos do "verdadeiro" Jesus, supostamente um homem da raça ariana.



Fatos científicos

Tanto Gobineau, quanto Chamberlain ou Rosenberg procuraram fundamentar suas teorias em fatos supostamente científicos, que relacionavam o volume do cérebro com o desenvolvimento da inteligência. A raça ariana apresentaria um cérebro maior do que o das outras raças, o que tornaria seus espécimes mais inteligentes e capacitados, sendo, portanto, destinados pela própria natureza a dirigir a humanidade.

Decorridos mais de 60 anos do fim do regimes nazista, é o caso de se perguntar como a ciência atual se posiciona quanto à questão das raças. A resposta mostra uma realidade que caminha no sentido oposto ao do pretendido pelos teóricos do racismo.

Para a antropologia, em especial a antropologia física, a raça é simplesmente um recurso que possibilita a classificação dos vários grupos do gênero humano, de acordo com características físicas diferentes que podem ser transmitidas por hereditariedade. Entre essas características, encontram-se a cor da pele, a altura, a conformação da cabeça e do rosto, a cor e a forma dos olhos, as qualidades dos cabelos, o formato do nariz, etc.

Não existem evidências científicas de que as diferenças raciais exerçam influência na capacidade inata de desenvolvimento intelectual ou emocional. Pelo contrário, os estudos históricos e sociológicos têm tendido a comprovar que as diferenças genéticas não são importantes na determinação das diferenças sociais e culturais entre os grupos humanos.



Unesco

Procurando tornar unânimes as ideias expostas acima, a Unesco - Organização das Nações Unidas para a educação, a ciência e a cultura - já se pronunciou nesse sentido, através de duas declarações sobre raça e racismo, redigidas por equipes qualificadas de antropólogos e geneticistas. Nelas se evidencia que o pensamento racista explora o preconceito racial de uma maneira particularmente nociva por atentar contra uma integração universalista de toda a humanidade.

Aliás, a posição pró-integração e contrária ao racismo foi assumida claramente por Barack Obama nos discursos proferidos após sua vitória eleitoral. Obama fez questão de dizer que "Não há uma América negra e uma América branca e uma América latina e uma América asiática. Há os Estados Unidos da América". Com isso, o presidente eleito faz coro ao líder negro Martin Luther King, cujo sonho era ver as pessoas "julgadas pelo caráter e não pela cor da pele".

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