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Hugo Chávez (1954-2013) - O futuro da Venezuela sem o chavismo

Em sua última visita ao Brasil, Hugo Chávez reuniu-se com a presidente Dilma Rousseff no Palácio do Planalto, em Brasília - Antônio Cruz/ABr
Em sua última visita ao Brasil, Hugo Chávez reuniu-se com a presidente Dilma Rousseff no Palácio do Planalto, em Brasília Imagem: Antônio Cruz/ABr

José Renato Salatiel*

Especial para a Página 3 Pedagogia & Comunicação

Atualizado em 26/04/2013, às 14h43.

Líder carismático, político controverso e mito da esquerda, Hugo Chávez, ao morrer de câncer na região pélvica aos 58 anos, no dia 5 de março, encerrou na Venezuela um dos regimes mais personalistas e longevos da América Latina.

Direto ao ponto: Ficha-resumo

Foram 14 anos sucessivos no poder, nos quais Chávez acumulou declarações polêmicas, acusações de corromper os princípios democráticos e críticas de uso do dinheiro do petróleo venezuelano para cooptar a população carente e “comprar” aliados.

Na área social, o governo chavista seguiu uma tendência de investimentos que caracterizou toda a política latino-americana após o fim das ditaduras, em governos tanto de esquerda quanto de direita. A redução da pobreza e a erradicação do analfabetismo foram, nesta área, as maiores conquistas da era Chávez.

Com efeito, a Venezuela é hoje o país com menor taxa de desigualdade na região. Segundo a ONU, o índice de Gini no país é de 41,0 (esse indicador, criado pelo matemático italiano Corrado Gini, serve de parâmetro internacional para medir a desigualdade: quanto mais próximo de 100, maior ela é). Para efeito de comparação, o índice de Gini do Brasil é de 51,9.

Outro dado, fornecido pela Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe, na sigla em espanhol), aponta que a porcentagem de pobreza na Venezuela passou de 49% em 1999 para 29% em 2010. Do mesmo modo, houve avanço na educação: o porcentual abaixo dos 5% coloca o país como uma zona livre do analfabetismo, segundo os padrões da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

Nem todos os problemas sociais, porém, foram resolvidos. A criminalidade aumentou e é hoje uma das principais preocupações dos venezuelanos. De 2011 a 2012, a taxa de homicídios passou de 67 para 73 para cada grupo de 100 mil habitantes, de acordo com o Observatorio Venezolano de Violencia e o Departamento de Estado dos Estados Unidos. Os números de homicídios na Venezuela são superiores aos de países muito mais populosos e em guerras contra o narcotráfico, como a Colômbia (32 por 100 mil) e o México (14 por 100 mil).

Inflação

Os maiores fracassos do governo de Chávez, contudo, foram na política e na economia, segundo analistas. A Venezuela é a nação com a maior reserva de petróleo do mundo, ultrapassando a Arábia Saudita. Mas o mau uso das reservas, somado ao descontrole com os gastos públicos, deixou o país mais pobre e gerou aumento de inflação (20%, a maior na América Latina), ao mesmo tempo em que a política de estatização afastou os investidores estrangeiros.

Na política, Chávez fez o que parecia ser impossível em regimes democráticos: se perpetuou no poder por uma série de manobras, eleições suspeitas e mudanças na Constituição. Ele pretendia permanecer no cargo até 2031, não fosse o câncer, que há dois anos surgiu para atrapalhar seus planos.

“Demônio”

Chávez foi eleito a primeira vez em 1999 e iniciou a “revolução bolivariana”, programa inspirado no líder revolucionário Simón Bolívar (1783-1830). Formou um governo de esquerda marcado pela perseguição aos adversários políticos, concentração de poderes no Estado e, na política externa, o antagonismo com os Estados Unidos, sobretudo com o governo de George W. Bush (2001-2009), a quem chamou de “demônio” em discurso na ONU. Chávez também se alinhou com países socialistas, como Cuba e China, e governos autoritários no Oriente Médio, como Síria e Irã.

No primeiro mandato (1999-2000), fez um referendo para convocar uma Assembleia Constituinte. As mudanças na Constituição aumentaram os poderes do presidente e de intervenção do Estado. Por conta dessas alterações, foram convocadas novas eleições em 2000, nas quais Chávez foi reeleito.

O segundo mandato (2000-2006) começou com medidas polêmicas, de estatização da economia e expropriação de terras. Em abril de 2002, o presidente viveu o momento mais dramático de sua vida política quando, após uma sucessão de greves, sofreu um golpe de Estado que o afastou do cargo por quase dois dias.

Em 2006, Chávez foi reeleito para um terceiro mandato (2006-2013). Em 2009, ele conseguiu aprovar a emenda constitucional que permite a reeleição ilimitada para alguns cargos públicos, incluindo o de presidente. O limite estabelecido pela Constituição venezuelana era de 12 anos, ou dois mandatos consecutivos de seis anos cada.

Censura

Já em 2010 o presidente viu cair sua popularidade diante de três medidas inusitadas: a desvalorização da moeda local, os planos de racionamento de energia e o cancelamento da transmissão de canais de TV a cabo. Entre as emissoras fechadas estava a Radio Caracas Televisión Internacional (RCTVI), que havia apoiado a tentativa de golpe oito anos atrás.

Finalmente, em 7 de outubro de 2012, ele venceu as eleições presidenciais para um quarto mandato consecutivo, tornando-se o presidente há mais tempo no cargo em toda a América Latina. As eleições dividiram o país: a parcela mais pobre apoiou Chávez, que obteve 54,84% dos votos, enquanto a classe média e empresarial apoiou o rival, o moderado Henrique Capriles, que obteve 44%. A doença, porém, o impediu de tomar posse no cargo.

Enfim, com a morte de Chavez, foram convocadas novas eleições que ocorreram em 14 de abril de 2013. Mesmo contando com todos os recursos da máquina administrativa governamental a seu favor, o presidente interino Nicolás Maduro só conseguiu 50,78% dos votos, contra 48,95% de seu adversário, o oposicionista Henrique Capriles. Trata-se de uma diferença pequena, que revela um país dividido e um chavismo enfraquecido. É impossível saber o que reserva o futuro próximo para a Venezuela.

Fique Ligado

É importante contextualizar o fato da morte de Hugo Chávez, pensando em seus possíveis impactos na América Latina. Nesse sentido, vale a pena rever as previsões para o continente aqui publicadas em janeiro deste ano. Em segundo lugar, a polêmica em torno de Chávez implica o conhecimento de conceitos essenciais da política: democracia e ditadura. Trata-se de conceitos fundamentais, que estão por trás de vários outros problemas da atualidade, como, por exemplo, a primavera árabe e a expansão econômica chinesa.

América em 2013: questões políticas e econômicas

 

 

Democracia: o que é

 

Democracia direta e indireta

 

Ditadura: o que é

 

Direto ao ponto

Hugo Chávez morreu de câncer na região pélvica aos 58 anos, no dia 5 de março, encerrando 14 anos do governo mais longevo na América Latina, em tempos de democracia. O legado de Chávez combina avanços na área social e fracasso na economia, além do enfraquecimento das instituições democráticas.

 

A Venezuela é hoje o país com menor índice de desigualdade na região. A taxa de pobreza caiu de 49% em 1999 para 29% em 2010. Já o índice de analfabetismo, abaixo dos 5%, coloca o país como uma zona livre do problema, segundo a Unesco. Apesar disso, as taxas de homicídios são as maiores da região: 73 mortes para cada grupo de 100 mil habitantes.

 

Na economia, o mau uso das reservas de petróleo, o descontrole dos gastos públicos e o programa de estatização afastaram investidores e geraram a maior taxa de inflação da América Latina (20%).

 

Na política, Chávez se perpetuou no poder por uma série de manobras, eleições suspeitas e mudanças na Constituição. Ele pretendia permanecer no cargo até 2031. Com as eleições em 14 de abril, Nicolás Maduro, o herdeiro político, foi eleito por pequena margem de votos sobre seu adversário.

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