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Análise do livro "Libertinagem" - Manuel Bandeira

Por Stockler Vestibulares*

Entre os 38 poemas de "Libertinagem", 14 foram escolhidos pelos professores do Stockler Vestibulares como os mais representativos. Leia os comentários:

1) "Porquinho-da-Índia" - Poema de tom narrativo e memorialista, destaca a pureza, a inocência de uma criança que dedica todo seu afeto a um bicho de estimação. O toque de humor fica por conta do verso final, espécie de conclusão em que se introduz a fala do eu lírico.

2) "Teresa" - Poema-paródia do texto lírico de Castro Alves chamado "O 'adeus' de Teresa". Antilírico, o poeta revela distância da idealização, confirmando, na última estrofe, a presença das transformações seja no plano físico, seja no sentimental.

O texto de Castro Alves é uma exaltação à beleza e ao erotismo da mulher amada, contudo, a última estrofe, acompanhada do tom grandiloquente do poeta, revela traição:

(fragmentos)
A vez primeira que eu fitei Teresa
Como as plantas que arrasta a correnteza
A valsa nos levou nos gritos seus...
E amamos juntos... E depois na sala
"Adeus" eu disse-lhe a tremer co'a fala...
E ela, corando, murmurou-me: "adeus!"
(...)
Quando voltei... era o palácio em festa!...
E a voz d'Ela e de um homem lá na orquestra
Preenchiam de amor o azul dos céus.
Entrei!... Ela me olhou branca... surpresa!
Foi a última vez que eu vi Teresa!...
E ela, arquejando, murmurou-me: "adeus"!
(Castro Alves)


3) "Madrigal tão engraçadinho" - "Madrigal" é uma pequena composição poética. Esse poema de Bandeira apresenta três versos e um tema que contraria o anterior: o lirismo amoroso do ponto de vista de uma criança que exalta o ser amado, porém por meio de uma comparação inusitada: o porquinho-da-Índia.

O grande momento do poema está nessa comparação, porque ela é sinônimo de sinceridade e alto valor, visto que, para a criança, o Porquinho-da-Índia marcara sua vida. É uma celebração à vida.

4) "A Virgem Maria" - As figuras que aparecem na primeira estrofe revelam a realidade opressora e a morte se pronunciando. Ansiedade, ira e hipocrisia compõem o quadro do enterro até que, em oposição à escuridão e à morte, surge a imagem da Virgem Maria, da qual o poeta só ouve a voz dizendo-lhe que "fazia sol lá fora". É a vida, a liberdade. O termo insistentemente foi grafado de forma especial no poema para enfatizar o seu significado.

5) "Oração no Saco de Mangaratiba" - O pedido do poeta a Nossa Senhora se dá em Mangaratiba, no Rio de Janeiro, e refere-se à vida. Enfadado, opõe a morte que o espreita à vida que, apesar de comprida, lhe parece tão mal cumprida. O poeta ainda tinha pela frente mais quarenta e dois anos!

6) "Poema tirado de uma notícia de jornal" - A morte é o grande tema. Ela é anunciada. Trata-se de uma notícia de jornal sobre a morte de mais um favelado. A miséria anônima e irônica (vem do alto, no morro da Babilônia, como o jardim suspenso da Babilônia) desce e chega à Lagoa Rodrigo de Freitas (lugar da classe alta no Rio de Janeiro). O drama e o elemento narrativo unem-se ao ritmo: versos longos na introdução e no desfecho. Versos curtos, dissílabos, quando se trata do prazer.

7) "Andorinha" - A vida, simbolizada pelo pássaro, é o exterior, o mundo, o cotidiano, todas as "coisas" que contrastam com o sofrimento, a tristeza do poeta que constata: não pôde viver o que queria, passou a vida à toa e, agora, só a morte o aguarda.

8) "Evocação do Recife" - A subjetividade, o memorialismo, a infância, o folclore e a cultura popular caracterizam esse famoso poema de Manuel Bandeira.

O eu lírico revive cenas do passado, como se fosse menino outra vez.

Ao lado das brincadeiras de infância, surgem pessoas com as quais conviveu: parentes, vizinhos, amigos. Até os nomes das ruas eram líricos: Rua da União, do Sol, da Aurora.

O poema alude ao erotismo, à força das águas, aos pregões e à exaltação do falar popular: "(...) língua errada do povo/ Língua certa do povo".

O ataque ao artificialismo linguístico, no tom da primeira geração modernista, está em: "Ao passo que nós/ O que fazemos/ É macaquear/ A sintaxe lusíada". Leia-se por nós, pessoas cultas - escritores, professores, leitores...

A morte, tema fundamental em Bandeira, surge nas últimas estrofes, reforçando que a cidade de Recife de seu passado fora-se como seu avô, restou-lhe apenas a memória.

9) "Não sei dançar" - Poema que abre o livro Libertinagem e traz elementos típicos da primeira geração modernista: os versos livres e brancos, aproximação do surrealismo, referência ao carnaval e à mistura de raças, às doenças "tropicais" e à crítica irônica à indiferença. Observe o título e a relação com os animados seres dos bailes. O poeta não sabe e não quer ser como eles! Porém, os prazeres escapistas acenam para o poeta.

10) "Pneumotórax" - Refere-se à doença de Manuel Bandeira - a tuberculose. A morte, novamente em evidência, é tratada em tom jocoso da primeira geração modernista: humor negro, coloquialismos, autoironia, além da técnica de marcação teatral com o emprego do diálogo.

Repare na linha pontilhada que quebra a narrativa dialogada, remetendo-nos também a uma quebra na respiração, e no verso 2 - célebre.

11) "Irene no Céu" - Embora o poema refira-se à imagem de uma pessoa querida pelo poeta, presente em sua infância, Irene representa também a mulher escrava, submissa, inferiorizada. O poeta sutilmente opõe branco e negro na segunda estrofe, onde Irene pede licença a São Pedro, chamando-o de meu branco.

Há ainda a exaltação à linguagem coloquial. A fala de São Pedro ordena: "- Entra, Irene. Você não precisa pedir licença". Na linguagem normativa, o correto seria conservar o tu ou empregar o verbo na 3ª pessoa do singular. Assim, teríamos:
- Entra, Irene. Tu não precisas pedir licença
- Entre, Irene. Você não precisa pedir licença

12) "Vou-me Embora Pra Pasárgada" - Nesse poema, Bandeira busca a utopia, a evasão, o lugar onde possa realizar-se, onde fuja da morte (Quando de noite me der / vontade de me matar), onde se mesclem os elementos reais e o nonsense, onde a doença não será empecilho porque simplesmente não existirá, onde a infância será revivida e os homens e mulheres que participaram de sua vida, presentes, representados por Rosa.

O coloquialismo, os versos em redondilha maior e a repetição do verso "Vou-me Embora Pra Pasárgada" remetem-nos à poesia popular.

O termo Pasárgada ocorreu ao poeta num momento de desânimo devido à doença. Ouvira no colégio algo sobre uma civilização ideal, antiga, fundada por Ciro, na Pérsia.

13) "Poema de Finados" - A morte a autocomiseração. Na primeira estrofe, o poeta dirige-se a um interlocutor - tu -, refere-se a cemitério e à sepultura do pai; na segunda, ao ritual de se colocar flores na sepultura e orar, porém alerta que o filho é quem necessita de oração. Na terceira estrofe, a explicação: o sofrimento, a amargura, já não há mais nada. Sente-se um morto vivo.

14) "Poética" - Espécie de plataforma teórica da poesia modernista, "Poética" é um texto de propostas e críticas. Propostas modernistas e críticas ao tradicionalismo, representado pela estética parnasiana.

São sete estrofes, sendo que a 1ª, 2ª, 4ª e 5ª criticam o formalismo, a burocracia e a falta de espontaneidade dos poetas parnasianos. Já a 3ª, 6ª e 7ª propõem a liberdade de expressão, a autenticidade, rompendo com o parnasiano tanto no plano do significante quanto do significado.

Trata-se, portanto, de um poema metalinguístico.

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