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São Marcos (Sagarana)
Guimarães Rosa

Do Stockler Vestibulares*
José (Izé), o narrador, médico novo, récem-chegado no Calango-Frito, embora supersticioso, não acredita em feitiçaria e vive caçoando de um curandeiro e feiticeiro local - o João Mangolô, cuja cafua vive repleta de clientes de suas rezas, seus despachos, mandingas e simpatias. Muitos outros no Calango-Frito estavam envolvidos com todo o tipo de bruxarias; Nhá Tolentina, já muito rica e considerada por seus despachos; Dona Cesária, que atuava em calungas de cera; e até o menino Deolindinho obteve feitiço contra os coques do professor.

Certo domingo, o narrador (Izé), a caminho de suas visitas ao mato das Três Águas, passa rente à cafua de João Mangolô e, como sempre, zomba do curandeiro e o insulta sem motivo.

Em outra ocasião, a caminho-do-mato, onde se entretinha na contemplação da natureza, de seus mínimos movimentos, dos bichos, árvores e flores, encontrou-se com Aurísio Manquitola e se entreteve com os casos dos terríveis efeitos e poderes da oração mágica de São Marcos, que o narrador também conhecia. A longa prosa com Aurísio envolveu também outros circunstantes: o Gestal da Gaita, o Compadre Silvério, o Tião Tranjão, o Cypriano, o Felipe Turco, entre outros, cada qual narrando os seus casos de feitiçaria.

José embrenha-se de novo no mato, absorto na contemplação da natureza, recordando o desafio poético travado com "Quem-Será", que se fazia em meio à natureza, pois os autores, sem se defrontarem, inscreviam os seus versos nos colmos (gomos) de belíssimos bambus.

Embora curioso, deixou para a volta a surpresa dos últimos versos de seu anônimo adversário, para envolver-se cada vez mais com a poesia da natureza, dos lagos, das flores, das árvores, dos pássaros, das aranhas, das formigas e das taturanas.

De repente, sem explicação, fica cego. Fica desesperado. Mas como conhecia a fundo os ruídos, cheiros e as mínimas vibrações do mato, dos ventos e dos animais, consegue se orientar. Irritado com a demora da luz, profere, com raiva, a reza de São Marcos. Tomado de fúria, avança numa só e precisa direção: a casa de João Mangolô. Vai guiado pelos ruídos e cheiros que, pouco a pouco, começam a se tornar familiares. Assim, chega, de súbito, na cafua do João Mangolô, e começa a esganá-lo, furioso. Nisso, volta a enxergar. O negro velho havia amarrado, por brincadeira vingativa, uma tira nos olhos de um retrato do narrador, irreverente e zombador, que não acreditava em feitiçaria, ainda que fosse supersticioso.

Há, no conto, três fábulas: a do feiticeiro e das feitiçarias, a do passeio e da natureza e a dos poemas. O principal ponto de convergência se manifesta na função criativa da palavra. Nas três fábulas, a palavra é valorizada não pela função referencial, de indicar seres existentes fora dela, mas enquanto forma de criação de novas realidades e de conhecimento, que se efetua principalmente graças ao plano da expressão.

Tanto no poema quanto na feitiçaria é quase irrisório conhecer o significado das palavras e enunciados. Este permanece como algo mais intuído que compreendido. A reza de São Marcos não interessa enquanto significado, sentido - "é melhor esquecer as palavras" - mas como rito, magia, iniciação transcendentalista.

Em todas as fábulas processa-se, assim, uma volta às origens: através da reintegração total dos sentidos, da aproximação com a natureza, da crença na força da palavra.

Conta-se, portanto, a história da revelação de um destino que se revela por um conhecimento estético superior do universo, manifesto na imersão sensual/sensorial mágica da natureza. A cegueira de Izé é o pretexto para que o autor faça aflorar outros sentidos, outras potencialidades do ser, que são, a seu modo, a "hora e vez" do narrador, a sua "travessia" no mundo do mistério e do encantamento.

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    *O Stockler Vestibulares foi fundado em 1984, em São Paulo.
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