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Livro fundamental de Euclides da Cunha - de quem celebramos, em 2009, o centenário de falecimento -, Os Sertões, como explicita o título, recupera o tema do sertão, ou do mundo sertanejo, enquanto polo oposto ao mundo civilizado, caracterizando-se pelas condições primitivas (e às vezes selvagens) de existência de seus habitantes, vivendo, em regra, à mercê da natureza.

A consciência desse sertão - quase uma entidade mítica, símbolo das áreas mais desertas do Brasil, onde uma sociedade rudimentar sobrevive divorciada do conforto do progresso encontrado no litoral - começou a se refletir, na ficção brasileira, a partir de alguns escritores românticos, como Bernardo Guimarães (O Ermitão do Muquém, 1869) e Taunay (Inocência, 1872).

Uma visão mais realista surgiria, anos depois, em Pelo Sertão, livro de contos de Afonso Arinos, publicado em 1898. No século 20, o tema seria retomado em várias obras menos expressivas, até que, em 1958, Bernardo Ellis publicasse O Tronco, romance pouco comentado mas brilhante, que enfoca a realidade do sertão do Centro-Oeste brasileiro. Ao mesmo tempo, João Guimarães Rosa conseguia atingir a própria estrutura psicológica do sertanejo - como se o sertão passasse a ser observado de dentro para fora, surpreendido em suas mais profundas motivações -, ao publicar Sagarana (1946), Corpo de Baile (1956) e Grande Sertão: Veredas (1956).

O livro de Euclides da Cunha surge, portanto, na passagem do Realismo para o Modernismo, em 1902, fruto das reportagens que o autor realizou, como enviado de O Estado de S. Paulo, durante a fase final da Campanha de Canudos (1897). Os textos jornalísticos, contudo, em nada se comparam à dimensão alcançada pela obra, na qual Euclides antepõe à narração da luta dos sertanejos duas partes introdutórias: "A Terra" e "O Homem".
 

Obra inclassificável

Construindo um painel gigantesco da paisagem física e humana do sertão nordestino, Euclides reúne um incrível volume de informações, uma espantosa multiplicidade de fatos e interpretações, fixando, na figura de Antônio Conselheiro, a expressão desse mundo atormentado e esquecido. A narrativa da terceira e última parte do livro, "A Luta", surge, dessa forma, como uma campanha sem glória, em que as forças governistas investem, cegas, contra uma comunidade miserável.

A obra é prejudicada pela visão fatalista de Euclides, que erra, em sua análise da “sub-raça sertaneja”, com a ciência da época. Apesar disso, Os Sertões permanece como uma contribuição essencial para o conhecimento de parcela da realidade brasileira.

Já no que se refere às características estéticas da obra, seu estilo de exuberância barroca explode numa linguagem rebuscada, verdadeiro convite a saborear as infinitas possibilidades da língua portuguesa.

Inclassificável, Os Sertões é, segundo Alfredo Bosi, “um testamento de paixão e de ciência”.

Para ler a obra

Quatro livros podem facilitar a leitura de Os Sertões:

  • a edição crítica de autoria do professor Leopoldo Bernucci e publicada num esforço conjunto da Ateliê Editorial, Imprensa Oficial do Estado e Arquivo do Estado;
  • o livro de José Carlos Barreto de Santana, Ciência & Arte: Euclides da Cunha e as Ciências Naturais (Editora Hucitec);
  • o minucioso trabalho de Manif Zacharias, que elucidou o vocabulário euclidiano em Lexicologia de "Os Sertões" (Editora Garapuvu);
  • a biografia de Euclides da Cunha, escrita pelo pesquisador norte-americano Frederic Amory: Euclides da Cunha: uma odisseia nos trópicos (Editora Ateliê).

    Fontes
  • José Paulo Paes & Massaud Moisés: Pequeno Dicionário de Literatura Brasileira (biográfico, crítico e bibliográfico), Editora Cultrix.
  • Alfredo Bosi, História Concisa da Literatura Brasileira, Editora Cultrix.

     

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