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Sim, estresse: escola top de Brasília incentiva clima de pressão

Aluno do Colégio Olimpo, de Brasília. Campeão do Enem por Escola, o colégio incentiva o estresse como motivação. Na camiseta: "Yes, Stress" - Divulgação
Aluno do Colégio Olimpo, de Brasília. Campeão do Enem por Escola, o colégio incentiva o estresse como motivação. Na camiseta: "Yes, Stress" Imagem: Divulgação

Edgard Matsuki

Do UOL, em Brasília

01/10/2014 07h00

Basta uma rápida caminhada pelo pátio da escola que teve a melhor nota do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) no Distrito Federal e se percebe o clima de pressão no ambiente. No Colégio Olimpo de Brasília, o estresse é considerado combustível para o bom desempenho do estudante. Tanto que a instituição adota slogans como “exigente como a vida” e alunos desfilam no local com camisetas e pastas com a sugestiva mensagem “Yes, Stress” [Sim, estresse].

Alunos da instituição chegam a estudar 16 horas por dia para se preparar para o Enem e para as provas do vestibular. Desse total, cerca de oito horas são em sala de aula e o resto do tempo é dividido em atividades de apoio pedagógico, oficinas e a preparação individual dos estudantes. “Deixamos o ambiente da escola para o aluno estudar. Alguns ficam até a noite”, diz o diretor pedagógico Vinicius de Miranda.

Todos os alunos que desejam entrar na escola passam por uma avaliação de suas notas anteriores e já recebem um aviso na entrevista de admissão. "Avisamos a ele que ninguém tem tratamento especial. Se o aluno não tem um desempenho tão bom em outra escola, avisamos que ele pode ter dificuldades", explica Miranda.

Estresse que motiva

O diretor pedagógico diz que o assunto estresse chega a ser recorrente com pais de alunos: “Explicamos que a escola é adepta ao ensino conteudista [que privilegia o conteúdo, a quantidade do conhecimento] e que o estresse pode funcionar como motivador”.

As exigências na escola acabam criando um padrão de aluno. De acordo com Miranda, o perfil do estudante do Olimpo é um aluno mais introspectivo, curioso e proativo. A maioria dos estudantes postulam vagas em universidades públicas de medicina ou engenharia. A escola aponta que cerca de um terço dos alunos chegam a ter dificuldades com notas e precisam de apoio pedagógico.

Além do incentivo ao estresse, outra forma de marketing da escola é mostrar o número de estudantes aprovados nos cursos preferidos -- uma estratégia bastante utilizada no mercado. Em um folheto de divulgação, há o número de 16 aprovações no IME (Instituto Militar de Engenharia) e no ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica)  e mais de 100 aprovações em medicina em diversas universidades. O mesmo folder mostra o preço para o semi-intensivo deste ano: quase R$ 9 mil por seis meses de estudo.

Os alunos Luis Cury e Kessi Jhones estudam 16h por dia no Colégio Olimpo, em Brasília - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Os alunos Luis Cury e Kessi Jhones são da turma que encara longas jornadas
Imagem: Arquivo pessoal

Jornada de 16 horas de estudo

Candidatos a uma vaga no IME ou no ITA, os estudantes do terceiro ano Luis Cury e Kessi Jhones, ambos com 17 anos, são dois exemplos de alunos que ficam 16 horas ao dia em cima dos livros.

No dia da entrevista, Cury havia chegado mais cedo à escola para aulas de reforço: “Em um dia regular, eu estudo das 6h às 22h. Pela manhã, plantões de estudo e das 14h às 21h, aulas. Eu gosto daqui porque uma escola regular não te exige tanto e não motiva tanto”.

Kessi adota outro horário de estudo: “Eu fico das 8h até a meia-noite. Meu hobby é o estudo”. O rapaz se mudou há cerca de um mês do Rio e está morando com outros sete alunos do Olimpo em um alojamento próximo à escola. “Eu já estudava esse quantidade de tempo. Mas admito que tem que gostar de estudar”.

Cury, 17, é aluno no Olimpo há três anos e conta que a sua turma de escola tem diminuído. “Quem não entra no ritmo, cai fora da escola. [A turma] Tinha uns 45 alunos. Sempre saem umas cinco pessoas por sala. Nem sempre o método funciona para todo mundo”, aponta.

Nem todo mundo gosta

Nem todos os alunos são fãs da escola como Kessi e Cury. No horário do intervalo, a reportagem do UOL fez um levantamento no pátio da escola com anônimos sobre como é o ensino.

Um rapaz de 17 anos disse que “a escola é boa no que se propõe. Mas não sabe se é o melhor método”. Outro estudante, da mesma idade, fez críticas, mas admitiu que a escola pode dar o que ele precisa: “Não concordo com o método de ensino daqui. Mas quero passar em medicina e, talvez, esse seja o preço a pagar”, conclui o estudante enquanto colegas olhavam espantados para a sua resposta.

O ritmo de estudos que "fabrica" calouros nos cursos mais concorridos do Brasil também recebe críticas de alguns especialistas em educação. Pedro Demo, PhD em sociologia e autor de livros sobre aprendizagem, diz que o sistema atual de ensino favorece escolas como o Colégio Olimpo. "A decoreba é favorecida. Me lembra o modelo da Coreia: aula de dia. Depois tutorias pagas. Decoreba frenética", diz.

Demo aponta que é preciso refletir sobre o que fica desse ritmo de estudos: "A escola privada liga-se fortemente a favorecer o sucesso no vestibular. Também tem sentido, claro. Mas fica pouca coisa para a vida. Aí é preciso ver o que se entende por 'educação' ou 'aprendizagem'", completa. 

O psicoterapeuta e colunista do UOL Leo Fraiman acha que uma rotina puxada, em prol da aprovação no vestibular, pode ajudar na vida futura do aluno quando ele tiver que enfrentar o competitivo mercado de trabalho.