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Caloura no curso de medicina na UFMG, atriz indígena do filme "Xingu" quer ajudar seu povo depois de graduada

Rayder Bragon

Do UOL, em Belo Horizonte

20/04/2012 10h54Atualizada em 20/04/2012 11h40

A indígena Adana Kambeba, que deu vida à personagem Kaiulú, no filme “Xingu”, longa sobre os irmãos indigenistas Villas-Bôas, deixou Manaus, no Amazonas, e trocou as telas do cinema por uma cadeira no curso de medicina da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), em Belo Horizonte, onde foi aprovada no vestibular específico para povos indígenas, em 2012. A caloura afirmou que, depois de formada, pretende retornar e trabalhar onde nasceu (ela pertence à etnia Kambeba).

No entanto, Adana disse que irá mesclar os conhecimentos adquiridos na universidade com as tradições medicinais indígenas. Assediada pela imprensa, ela confidenciou não ter tido ainda muito tempo para se dedicar aos estudos, mas considerou normal a situação e até positiva para divulgar a cultura indígena. Ela está há um mês na capital mineira. O curso tem duração de seis anos.

“Faltam profissionais de saúde que queiram ou se sintam motivados para morar no Amazonas para fazer esse trabalho com as pessoas de lá. Elas ficam lá pouco tempo e depois vão embora”, afirmou. Outro fator apontado por ela, que além do nome indígena, que consta do Registro Administrativo de Nascimento de Índio, chama-se Danielle Soprano Pereira, pela certidão de nascimento, é o fato de que, na sua visão, os médicos não indígenas não aceitam com facilidade a mescla entre as duas culturas.

“Entre os que vão para lá, existem aqueles que não estão predispostos a entender a cultura local, não por maldade, mas acabam impondo, sem querer, a sua medicina, a sua forma de tratamento, de curar, e esquecem que aquela comunidade também tem seus valores inerentes a sua cultura”, salientou.

Adana cita, para exemplificar a sua argumentação, a ação dos pajés, dos curandeiros, dos xamãs e dos raizeiros na cultura indígena. “Pretendo mesclar as duas medicinas, a ocidental e a tradicional, e assim, provocar uma espécie de diálogo entre ambas. A visão que eu tenho é que as duas medicinas possuem uma riqueza e que têm muito a contribuir ao se complementarem”, esclareceu.

Força da mulher

Adana afirmou que, para tanto, ainda pretender se enfronhar na medicina indígena depois de concluir o curso na UFMG. A intenção dela será a de se tornar pajé. “Eu teria que me capacitar na medicina tradicional (indígena). Os pajés tem um conhecimento profundo não somente do corpo, mas eles têm uma relação com a espiritualidade. Vou me submeter a uma preparação para pajé”, afirmou.

Ela disse que existem mulheres indígenas exercendo essa função e ainda exaltou a força feminina. “Existem inclusive caciques mulheres e que são muito aguerridas”, ressaltou.

Adana reside em uma moradia para estudantes, ofertada pela universidade, localizada no bairro Ouro Preto, região da Pampulha. Ela ainda conta com uma bolsa de estudos. Assim como outros alunos indígenas, Adana tem o acompanhamento de um tutor para facilitar na sua adaptação à universidade e ao curso.

Ela disse que a ambientação em Belo Horizonte está sendo muito boa por conta de o mineiro, na opinião dela, ser muito “caloroso e hospitaleiro”. Ainda segundo ela, a interação com os colegas “está sendo muito boa”. “Essa convivência está possibilitando para todos nós a questão da diversidade cultural, que enriquece, faz você refletir e amplia a sua mente”, declarou.

A turma de medicina na qual Adana está matriculada existem apenas dois alunos indígenas. Ao todo, são 12 vagas destinadas a indígenas por ano em seis cursos ofertados pela universidade. O programa começou em 2010.