Topo

"Viagem de Lula implica em riscos políticos"

Atualizado em 29/01/2015, às 12h49

Por Dílson Catarino*:

"Viagem de Lula implica em riscos políticos."

Essa notícia traz uma polêmica gramatical muito comum no dia a dia do brasileiro. Todos, se não usaram, já ouviram alguém dizer implica em alguma coisa. É certo ou não?

Segundo o padrão culto da língua portuguesa, o verbo implicar só admite a preposição em em dois casos:

1- Quando significar envolver-se em complicação, em embaraço; comprometer(-se), envolver(-se), ele será verbo transitivo direto e indireto ou pronominal. Por exemplo:

  • A amante implicou o deputado em negócios ilícitos. Neste caso implicar é transitivo direto e indireto, tendo como objeto direto o deputado e como objeto indireto, negócios ilícitos.
  • O deputado implicou-se em negócios ilícitos. Neste caso implicar é verbo pronominal.

2- Quando significar agir de modo inconsequente, ele será pronominal: Impliquei-me em confusões mentais.

Em nenhum outro sentido, segundo a norma culta da língua, implicar poderá ser usado com a preposição em.

Há casos em que pode ser usado com a preposição com. São eles:

1- Quando significar ser incompatível com; não estar de acordo com; desarmonizar. Por exemplo:

  • O seu procedimento implica com as normas da empresa.

2- Quando significar demonstrar antipatia. Por exemplo:

  • O pai implicava com o namorado da filha.

Em todos os outros sentidos, sempre segundo a norma culta da língua portuguesa, usa-se implicar sem preposição:

1- Quando significar causar ou sentir confusão. Por exemplo:

  • As reclamações do namorado implicaram o seu raciocínio.

2- Quando significar ter como consequência, acarretar. Por exemplo:

  • Essa decisão poderá implicar prejuízos futuros.

3- Quando significar dar a entender, fazer pressupor. Por exemplo:

  • Todos os passos do criminoso implicavam premeditação.

4- Quando significar tornar necessário. Por exemplo:

  • O combate à inflação implica a adoção de medidas drásticas.

Essas são, então, as maneiras adequadas ao padrão culto da Língua Portuguesa de se usar o verbo implicar. Mas, por que escrevi lá no começo do texto polêmica? Veja por quê:

No Dicionário Prático de Regência Verbal, do prof. Celso Pedro Luft, há uma observação: "Implicar em algo é inovação em relação a implicar algo por influência de sinônimos como redundar, reverter, resultar, importar. Aparentemente um brasileirismo (negrito meu). Plenamente consagrado, admitido até pela gramática normativa: 'Está ganhando foros de cidade na língua culta a sintaxe implicar em: Tal procedimento implica desdouro (ou em desdouro) para você ' (Rocha Lima)".

Eis aí a polêmica. Afinal, é certo ou não usar a preposição em? A resposta é a seguinte: não é certo, nem errado. Depende de como se queira comunicar com as outras pessoas: no padrão popular, não há por que se preocupar com as regras gramaticais, então se pode usar implicar em. No padrão culto, as regras devem ser obedecidas sempre, então deve-se usar implicar algo quando quiser comunicar-se dentro das normas cultas da língua portuguesa, como, por exemplo, em documentos oficiais, em dissertações de vestibulares, em conversar formais e em textos jornalísticos.

A frase apresentada traz o verbo implicar no sentido de ter como conseqüência, acarretar, então, no padrão culto, deveria ficar assim:

"Viagem de Lula implica riscos políticos."

*Professor de gramática da língua portuguesa, literatura e redação, desde 1980.