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Machado de Assis utiliza-se do conto psicológico
Thaís Nicoleti de Camargo*
Especial para a Folha de S. Paulo
Em "Várias Histórias", de Machado de Assis, livro de contos selecionado pelo vestibular da PUC de São Paulo, encontramos alguns dos mais geniais exemplares da maestria do autor no gênero.

Pertencem ao que se convencionou chamar a "segunda fase" do escritor, ou seja, aquela que sucedeu ao aparecimento das "Memórias Póstumas de Brás Cubas", romance este que, desprezando as idealizações românticas, representou verdadeira revolução ideológica e formal.

Humor, ironia, deboche, filosofia e até tragédia mesclam-se em situações prosaicas, palco privilegiado da revelação do caráter ou da alma humana a que procede o autor.

Em "A Cartomante", está o tema do triângulo amoroso e do adultério, já presente nas "Memórias" (Brás Cubas, Virgília, Lobo Neves).

Os amigos de infância Camilo e Vilela, depois de longos anos de distância, reencontram-se. Vilela casara-se com Rita, que mais tarde seria apresentada ao amigo. O resto é paixão, traição, adultério.

A situação arriscada leva a jovem a consultar-se com uma cartomante, que lhe prevê toda a sorte de alegrias e bem-aventuranças.

O namorado, embora cético, na iminência de atender a um chamado urgente de seu amigo Vilela, atormentado pala consciência, busca as palavras da mesma cartomante, que também lhe antecipa um futuro sorridente.

Dois tiros à queima-roupa ao lado do cadáver de Rita o esperavam. A vitória do ceticismo coroa o episódio.

Em "A Causa Secreta", Machado faz talvez um de seus melhores "desenhos psicológicos". Revela-nos a personalidade de um sádico, capaz de realizar "boas ações" desde que estas lhe permitam o exercício de seu prazer.

A descrição da tortura a que submete um rato é página antológica na literatura brasileira. "Um Homem Célebre" é a história da frustração de um compositor de polcas cujo maior desejo era criar obras clássicas.

Conto repleto de humor, mostra a cruel ironia do destino, que persegue o pobre Pestana com as composições efêmeras de gosto popular, imediatamente "consagradas pelo assobio". Morre "bem com os homens e mal consigo mesmo".

"O Enfermeiro" está, certamente, entre os melhores contos do autor. Narrado em primeira pessoa a um interlocutor imaginário, é a história do último enfermeiro do rabugento coronel Felisberto, que esgana seu indócil paciente.

Sofre o drama de consciência, intensificado pela herança do pecúlio do velho, mas a culpa arrefece quando se vê reconhecido por sua dedicação extrema. São todos exemplos maduros do realismo machadiano.
*Thaís Nicoleti de Camargo é consultora de língua portuguesa da Folha
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