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Machado de Assis desvenda natureza humana
Thaís Nicoleti de Camargo*
Especial para a Folha
A antologia "Várias Histórias", de Machado de Assis, leitura obrigatória para quem vai prestar o exame da Unicamp, teve sua primeira edição em 1896. Mas seus 16 contos, testemunhos da sempre surpreendente natureza humana, atravessam a barreira do tempo: muito de seu encanto vem do reconhecimento imediato de situações psicológicas comuns.

O distanciamento que Machado estabelece da matéria com que lida faz parecer serem tais episódios exemplares de conclusões -de verdadeiras teses- a que chegou a partir da observação do comportamento humano.

"A Cartomante", conto de abertura do livro, parte do tema do adultério, recorrente na obra machadiana. Estabelece-se um triângulo amoroso: uma mulher entre dois homens. A insistência no tema parece ironizar o idealismo romântico. Mas esse não é um conto sobre o adultério. Mais importante na história parece ser a crítica à credulidade, tratada o tempo todo como mera tolice. Camilo, amante de Rita, ri-se da ingenuidade da moça, que buscara na cartomante um alívio para sua insegurança ou culpa. Mas, depois, ele fará o mesmo e se deixará enganar pelas mesmas palavras tolas da adivinha.

A morte trágica dos amantes não é o castigo final imposto aos que praticaram um ato moralmente reprovável. Não é a preocupação moralista que move o conto -e o próprio título, que focaliza a figura da cartomante, nos dá essa pista. A punição dos dois se dá antes por terem sido ingênuos que por terem cometido traição ou adultério. É a ingenuidade que é castigada com a morte.

"Entre Santos" é a narrativa "surrealista" de uma conversa ouvida à socapa pelo capelão de uma igreja. No diálogo, santos ironizam a economia do sistema de promessas que rege a relação dos devotos com a própria fé.

"Um Homem Célebre" mostra a luta entre a vocação e a ambição. Pestana é um bem-sucedido compositor de polcas, ritmo popular e dançante, mas ambiciona a glória de compor concertos e vive atormentado pela falta de inspiração. Constantemente amofinado pelo reconhecimento público da capacidade indesejada, vive a frustração de ser um homem comum.
O conjunto dos contos revela subordinar-se à aparência enganadora uma essência oculta. E Machado volta seu olhar para as reações humanas, sempre reveladoras dessa natureza secreta.
*Thaís Nicoleti de Camargo é consultora de língua portuguesa da Folha
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