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Quando a linguagem não está sozinha
*Odilon Soares Leme
Especial para a Folha de S.Paulo
A reflexão, neste espaço, destina-se ao jovem que se prepara para o vestibular, tentando ajudá-lo nessa empreitada. Ele sabe que seu sucesso depende em grande parte do domínio de nossa língua. Mas é bom lembrar, desde logo, que a prova não é simplesmente de língua portuguesa. É de comunicação e expressão, no mais amplo sentido desses termos. É preciso saber lidar com os mais variados tipos de códigos que permeiam a sociedade. E os vestibulares costumam cobrar isso.

Se alguém ainda acha que o problema da linguagem se resume à questão do "certo" e do "errado", basta que assista a uma sessão das CPIs que acontecem no legislativo federal para mudar de ideia. Assistir a uma transmissão direta dessas sessões é muito diferente de estar diante de uma fria página da imprensa, buscando, por meio de procedimentos estritamente linguísticos, reconstruir na mente a rede de significados que alguém nela procura construir.

A linguagem falada, viva, deixa de ser um código isolado e se vê envolta numa enorme quantidade de outros códigos, tão ou mais expressivos às vezes que o código com que se constroem os enunciados. Conta muito a expressão facial de quem fala e de quem ouve, o olhar fulminante, o sorriso que se esboça ou a risada que cascateia. Contam os gestos desenhados pelas mãos, os variados meneios da cabeça, o mover-se desassossegado de todo o corpo. Há frases que são gritadas, há palavras que são escondidas; há expressões que afagam ou aliciam, há silêncios que são descrença e condenação.

Engana-se, infelizmente, quem pensa que a linguagem se destina a transmitir a verdade. Nas CPIs, ela tem servido para esconder, para falsear ou confundir. Palavras mudam de sentido. Caixa 2 passa a ser "dinheiro não contabilizado"; lealdade toma ares de cumplicidade. A verdade é tão rara que precisa ser garimpada, capturada por meio de armadilhas verbais e, se for o caso, obtida pela barganha da delação premiada. É preciso agilidade mental para lidar com expressões inusitadas como "acordão", "operação abafa", "banda boa" e "banda ruim" do Congresso, "perder o foco" e até o decantado "eu repilo"...

A verdade, como se vê, não depende apenas de uma linguagem bem construída. Depende, e muito, do caráter de quem fala. Mas é inegável, também, que uma competente análise do ato comunicativo alcança, para além dos significados do enunciado, o caráter, as intenções, a educação e a confiabilidade do enunciado. É assistir e verificar.
*Odilon Soares Leme é professor do Anglo, responsável pela vinheta "S.O.S. Língua Portuguesa" da rádio Jovem Pan e autor de "Tirando Dúvidas de Português" e de "Linguagem, Literatura, Redação (Editora Ática)
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