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Língua é objeto de investigação científica
Thaís Nicoleti de Camargo*
Especial para a Folha de S. Paulo
A cada dia os estudantes têm demonstrado mais curiosidade pelo campo de estudo da linguística. O interesse vem revelar tanto o desconhecimento dessa área do saber como o seu crescente prestígio, que já a faz sair de relativa obscuridade.

A linguística lança sobre o idioma, seu objeto de estudo, o olhar da ciência, com seu método investigativo de observação dos fenômenos e total ausência de preconceito, condições preliminares para a busca do conhecimento.

Essa isenção, aliada à disposição de descobrir o real funcionamento das línguas e os fatores intralinguísticos e extralinguísticos que o regem, faz que a linguística não trabalhe com os conceitos de "certo" e "errado". Elabora uma gramática descritiva em lugar de uma gramática prescritiva.

Por ser uma ciência, a linguística não é sensível às preocupações com um suposto risco de "descaracterização" do idioma, visto que, por sua natureza, a língua só assimila as transformações que lhe são úteis e necessárias.

Assim, a defesa intransigente do uso da norma culta - o padrão dos estratos mais bem-sucedidos na sociedade -, entendida como o único modelo de correção, pode levar ao reforço de certos preconceitos associados a usos linguísticos próprios de camadas economicamente desfavorecidas.

A linguagem espontânea é igualmente alvo do interesse da linguística, pois ela representa a língua viva, em ação. Já a norma tida como culta é preservada graças a uma atitude disciplinadora que se apoia em certos cânones. Afiança-se na tradição, explicação última para a escolha de uma forma em detrimento de outra.

Mas a própria literatura - fornecedora dos melhores modelos de realização linguística - incorporou definitivamente elementos da linguagem oral. "A contribuição milionária de todos os erros", diria Oswald de Andrade no "Manifesto Pau-Brasil", em 1924.

Diante disso, o estudo das possibilidades oferecidas pela norma culta conserva sua importância em virtude de a expressão sobretudo de conteúdos complexos e racionais servir-se das estruturas que a história e a cultura nos põem à disposição.

Não se trata de abandonar o passado - como se fosse possível renegar a história -, tampouco de substituir uma construção por outra como mera afirmação de um saber como valor em si. Trata-se antes de acrescentar à capacidade linguística alternativas de expressão não intuitivas ou menos espontâneas e mais sutis, mantendo um constante diálogo com a história.

A linguística contribui, assim, para uma compreensão do fenômeno linguístico como parte indissociável da cultura.
*Thaís Nicoleti de Camargo é consultora de língua portuguesa da Folha
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