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Figuras de pensamento
 

São recursos estilísticos para tornar nossa expressão mais contundente e provocar impacto no ouvinte ou leitor. Entretanto, o efeito que provocam origina-se mais das ideias que estão por trás das palavras do que por elas mesmas ou pela construção das frases. São também chamadas de figuras de imagística, pois têm o objetivo de apelar à imaginação do leitor (ou do nosso interlocutor).

1. Acumulação: o encadeamento de palavras ou expressões na frase é uma ocorrência normal nos discursos. Em dois casos, no entanto, a sequência pode criar efeito artístico:

1.1. Enumeração: quando os elementos encadeados não guardam entre si qualquer relação de ordem ou hierarquia:
Um mover de olhos, brando e piedoso,
Sem ver de quê; um riso brande e honesto,
Quase forçado; um doce e humilde gesto,
De qualquer alegria duvidoso;

Um desejo quieto e vergonhoso;
Um repouso gravíssimo e modesto;
Uma pura bondade, manifesto
Indício da alma, limpo e gracioso;


Um encolhido ousar; uma brandura;
Um medo sem ter culpa; um ar sereno;
Um longo e obediente sofrimento:
[...]
(Camões)

1.2. Gradação: quando há palavras ou expressões subordinadas a uma hierarquia:
E, assim, está o coração, cada ano, cada dia, cada hora, sempre alimentado em contemplar o que não vê [...].
(Rui Barbosa)

2. Alusão: referência a obras literárias famosas, a personagens ficcionais notáveis, a vultos históricos, mitológicos ou bíblicos. Muitas vezes, a alusão não é feita diretamente a uma entidade legendária ou mitológica, porém a uma circunstância através da qual ela se celebrizou (por exemplo: leito de Procusto, espada de Dâmocles, etc.):
O próprio Deus da Guerra, desumano,
Não viveu de amor ileso;
Quis a Vênus e foi preso
Na rede que lhe armou o Deus Vulcano.
(Tomás Antônio Gonzaga)

3. Antítese: aproximação de ideias contrárias:
Ora galgando altura, ora caindo,
Ora na multidão, ora no ermo,
Alguns afirmam que é um talento lindo,
Outros que é um pobre e simples estafermo.
(Emílio de Menezes)

4. Correção (ou epanortose): retorno a uma palavra ou frase proferida, seja para corrigir a afirmação, seja para enfatizá-la ou atenuá-la:
...Perdão, mas este capítulo deveria ser precedido de outro, em que contasse um incidente, ocorrido poucas semanas antes, dois meses depois da partida de Sancha. Vou escrevê-lo. Podia antepô-lo a este, antes de mandar o livro para o prelo, mas custa muito alterar o número de páginas; vai assim mesmo, depois a narração seguirá direita até o fim. Demais, é curto.
(Machado de Assis, Dom Casmurro)

5. Dubitação: apresentação de uma dúvida através de uma falsa interrogação (falsa porque seja vaga ou contenha em si mesma a resposta):
Ah! mas então tudo será baldado?!
Tudo desfeito e tudo consumido?!
No ergástulo d'ergástulos perdido
Tanto desejo e sonho soluçado?!

Tudo se abismará desesperado,
Do desespero do Viver batido,
Na convulsão de um único Gemido
Nas entranhas da Terra concentrado?!
[...]
(Cruz e Sousa)

6. Eufemismo: enunciação atenuada de uma ideia, a fim de livrá-la do sentido desagradável, indecoroso ou grosseiro:
Quem passou pela vida em branca nuvem,
E em plácido repouso adormeceu;
Quem não sentiu o frio da desgraça,
Quem passou pela vida e não sofreu:
Foi espectro de homem, não foi homem,
Só passou pela vida, não viveu.
(Francisco Otaviano)

7. Imprecação: lançamento de ameaça, anátema ou esconjuro sobre alguém:
Maldita sejas pelo ideal perdido!
Pelo mal que fizestes sem querer!
Pelo amor que morreu sem ter nascido!
(Olavo Bilac)

8. Ironia: emprego de uma frase ou expressão em sentido diverso ou oposto daquele que seria o coerente ou lógico, produzindo um efeito de crítica ou zombaria:
Tudo acabava com os ladrões amarrados e conduzidos à vila mais próxima, às vezes com algumas costelas quebradas, mas que diabo! o lombo carece sofrer um bocadinho.
(Carlos Drummond de Andrade)

9. Paradoxo (ou oximoro): figura em que se combinam palavras de sentido oposto que parecem excluir-se mutuamente, mas que, no contexto, reforçam a expressão que se deseja transmitir:
Ardor em firme coração nascido!
Pranto por belos olhos derramado!
Incêndio em mares de água disfarçado!
Rio de neve em fogo convertido!

(Gregório de Matos)

10. Preterição (ou paralipse): figura pela qual se finge não querer falar de coisas sobre as quais se está, indiretamente, falando:
E vede agora a minha modéstia: filiei-me na Ordem Terceira de ***, exerci ali alguns cargos, foi essa a fase mais brilhante da minha vida. Não obstante, calo-me, não digo nada, não conto os meus serviços, o que fiz aos pobres e aos enfermos, nem as recompensas que recebi, não digo absolutamente nada.
(Machado de Assis, Memórias Póstumas de Brás Cubas)

11. Prolepse (ou antecipação): recurso por meio do qual o escritor (ou o falante) se antecipa às iniciativas ou objeções alheias:
Hão de chorar por ela os cinamomos,
Murchando as flores ao tombar do dia.
Dos laranjais hão de cair os pomos,
Lembrando-se daquela que os colhia.

As estrelas dirão: "Ai, nada somos,
Pois ela se morreu silente e fria..."
[...]
(Alphonsus de Guimaraens)

Fonte
Figuras de estilo, José Geraldo Pires-de-Mello, Editora Rideel/Centro Universitário de Brasília - UniCEUB, 2ª edição, São Paulo, 2001.

 
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