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Aluno carente da USP passa o dia com R$ 11; veja o que estudantes fazem para se manter

Amanda Serra e Suellen Smosinski

Do UOL, em São Paulo

08/07/2011 07h00

Ingressar na universidade pública é o sonho da maioria dos jovens brasileiros de baixa renda. Entretanto, essa não é uma tarefa fácil. Dentre diversos motivos, relatados por estudantes carentes em entrevista ao UOL, os principais deles são o sucateamento da educação básica e a dificuldade financeira em se manter na faculdade.

Aluno do curso de contabilidade na USP, oriundo de escola pública, Enedino Neres da Cruz Júnior, 19, resolveu abandonar o trabalho como auxiliar administrativo para se dedicar aos estudos. O esforço deu frutos e ele conseguiu ser aprovado nos vestibulares mais concorridos do país – USP (Universidade de São Paulo), Unesp (Universidade Estadual Paulista) e Unicamp (Universidade de Campinas). “Somos sempre o herói da nossa própria história”, diz o adolescente.

O jovem diz não ser fácil se manter na faculdade. No dia em que o UOL o acompanhou, ele gastou apenas R$ 11. “Nas primeiras semanas, tive dificuldade para pagar os três ônibus que utilizo para chegar à universidade. Depois que eu recebi a bolsa fiquei mais aliviado”, conta o estudante, que recebe um auxílio no valor de R$ 300 mensais, além dos tickets de alimentação popular (R$ 1,90 cada), ambos disponibilizados pela USP.

Morador do Jardim São Luís, zona sul de São Paulo, o universitário é o primeiro de sua família a ingressar no ensino superior público. Os pais de Enedino são divorciados e ele mora com a mãe, que trabalha como empregada doméstica e o ajuda com os gastos acadêmicos -livros, condução, alimentação e xerox.

Bilhete único sem crédito

A realidade social dos colegas de faculdade de Enedino é bem diferente da sua. “Nos primeiros dias de aula as pessoas comentavam que tinham ganhado um carro dos pais, porque passaram na universidade, e eu estava ali apenas com o meu bilhete único sem crédito, mas feliz

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“O convívio com a nova galera da faculdade é complicado. Eu estava acostumado a lidar com pessoas de poder aquisitivo relativamente baixo e agora estou aprendendo a conviver com indivíduos cuja situação financeira é mais cômoda. Mas é uma questão de adaptação.”

Enedino sonha em viajar para o exterior, dar uma vida melhor e tranquila para a mãe e trabalhar em uma instituição internacional. “Gostaria trabalhar na ONU (Organização das Nações Unidas), OMC (Organização Mundial do Comércio) ou no Banco Mundial”, revela o universitário,que atualmente trabalha como voluntário em um cursinho popular.

Estágio e curso

Morador de Caieiras, interior de São Paulo, Guilherme Duarte, 21, caçula de três filhos, é o primeiro da família a ingressar no ensino superior público. Com uma renda familiar de R$ 1.800 mensais, o estudante não conseguiria pagar a graduação se não tivesse ingressado na universidade pública. O universitário conta como é estudar engenharia naval (USP) e conciliar o estágio, já que seu curso é integral.

“Estagiar é importantíssimo na carreira de qualquer universitário. As pessoas saem da Poli (Escola Politécnica da USP) com muito conhecimento técnico, mas muitas vezes sem nenhuma experiência profissional. Além do dinheiro, que para mim é importante, acredito que a prática também contribuiu para o aprendizado”, avalia Duarte, que trancou algumas disciplinas escolares para poder trabalhar e estudar.

Antes do estágio remunerado, Guilherme se mantinha na universidade por meio de bolsas de estudos. “Nos dois primeiros anos de faculdade eu recebi um auxílio financeiro da Associação dos Engenheiros Politécnicos, no valor de R$ 465 mensais, além da bolsa de iniciação científica.”



86 quilômetros por dia

Enfrentar a distância entre Caieiras e o Butantã (86km), onde está localizada a Cidade Universitária, e o trânsito de São Paulo são alguns dos desafios constantes na rotina de Guilherme, que demora cerca de 2h para ir de um lugar ao outro. “Não ter carro e depender de transporte público dificulta. Eu já perdi várias provas porque cheguei atrasado.”

Estudar no exterior é um dos próximos passos que o jovem deseja dar para alcançar seus objetivos. “Quero me formar, viajar, conseguir um bom emprego e assumir alguma posição de alto escalão ou ser empreendedor”, deseja o futuro engenheiro.