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Síria vive uma "miniguerra mundial" - quem são os protagonistas desse conflito?

Família síria deixa área de al-Muasalat após bombardeio em Aleppo, na Síria - Thaer Mohammed/AFP
Família síria deixa área de al-Muasalat após bombardeio em Aleppo, na Síria Imagem: Thaer Mohammed/AFP

Por Carolina Cunha, da Novelo Comunicação

Pontos-chave

  • A guerra civil da Síria começou em 2011 com protestos antigoverno que foram reprimidos de maneira sangrenta pelo regime. A revolta popular deu origem a uma guerra civil entre as forças leais ao presidente Bashar al-Assad e oposicionistas.
     
  • Hoje o conflito se multiplicou e envolve centenas de grupos armados: forças do governo sírio, rebeldes, curdos, radicais islâmicos e potências estrangeiras.
     
  • De um lado, Rússia e Irã apoiam o governo da Síria. De outro, os Estados Unidos e países europeus apoiam os rebeldes que buscam derrubar o governo do presidente sírio Bashar al-Assad.
     
  • A Turquia apoia os rebeldes contra o presidente sírio e ataca tropas curdas próximas a sua fronteira.
     
  • Em comum, todos lutam contra os radicais do Estado Islâmico.
     
  • Analistas avaliam que a atuação de liderança da Rússia e dos Estados Unidos lembra o período da Guerra Fria.

Imagens brutais de vítimas civis da guerra da Síria assombraram os noticiários do mundo inteiro no mês de setembro e jogaram os holofotes para a situação atual do país. No ataque, os dois principais hospitais do leste da cidade de Aleppo foram bombardeados. O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, classificou os ataques como "crimes de guerra".

Quem estava por trás do bombardeio da cidade de Aleppo não era o exército do presidente sírio Bashar al-Assad, mas as tropas russas, que buscavam alvos nos bairros controlados pelos rebeldes. Mas o que está acontecendo na Síria?

Depois de 5 anos e meio de guerra civil, ao menos 250 mil sírios morreram e 11 milhões de pessoas tiveram que deixar suas casas e engrossar as filas de refugiados que buscam abrigo em outros países, segundo dados da ONU e do Observatório Sírio de Direitos Humanos. Milhares deles fazem parte da mais recente crise migratória na Europa.

A guerra civil da Síria começou em 2011 com protestos antigoverno que foram reprimidos de maneira sangrenta pelo regime. A revolta popular deu origem a uma guerra civil entre as forças leais ao presidente Bashar al-Assad e oposicionistas.  O presidente sírio continua a lutar com o objetivo de reaver o controle sobre todo o país.

Hoje o conflito se multiplicou e envolve forças do governo sírio, rebeldes, radicais islâmicos e potências estrangeiras. O jornal The Washington Post descreveu o que ocorre hoje na Síria como uma "miniguerra mundial". Entenda os principais protagonistas desse conflito hoje.

Estado Islâmico

O conflitou se agravou com a entrada no território dos militantes radicais do Estado Islâmico (EI), que se aproveitaram da instabilidade na região para fazer ofensivas relâmpago, conquistando rapidamente novos territórios. O grupo jihadista foi criado em 2013 e cresceu como um braço da organização terrorista al-Qaeda no Iraque. O EI atacou povoados e cidades e declarou um califado na região entre o Iraque e Síria. O grupo luta para derrubar o governo de Bashar al-Assad e expandir seus domínios. Para isso, usa táticas brutais como assassinatos em massa e decapitações. Além de importantes cidades, o EI domina reservas de petróleo, represas, estradas e fronteiras.

O Estado Islâmico une os lados opostos neste conflito: derrota-lo é o único objetivo que os rebeldes, o governo sírio e potências estrangeiras têm em comum. Analistas internacionais avaliam que a tendência é que em breve os militantes do Estado Islâmico fujam do Iraque e Síria rumo ao Líbano.

Estados Unidos e Europa

Desde 2014 os Estados Unidos realizam uma intervenção militar no país. Para isso, o país criou uma coalizão internacional responsável por ataques aéreos no Iraque e na Síria.
O Estado Islâmico é o principal alvo dos EUA. O presidente Barack Obama declarou que pretende destruir a força bélica do Estado Islâmico e defende a saída do presidente sírio como medida imprescindível para derrotar o grupo. Os norte-americanos ainda não enviaram soldados ao combate, como já fizeram no Iraque e Afeganistão, mas possuem tropas para treinar e fornecer armamentos a forças rebeldes locais.

A coalizão internacional liderada pelos EUA é chamada de Forças Democráticas Sírias (FDS), e conta com milícias de combatentes árabes, cristãos e curdos. As FDS combatem os extremistas do grupo EI e buscam estabelecer uma Síria democrática no futuro.

A OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) também realiza operações militares na Síria, mas de uma forma mais modesta. A aliança militar congrega países da Europa e da América do Norte.

Rússia

A intervenção militar da Rússia começou em setembro de 2015, quando o presidente Vladimir Putin enviou bombardeiros, helicópteros e mísseis de cruzeiro em apoio às Forças Armadas do presidente Bashar al-Assad. A Síria representa a primeira intervenção militar das Forças Armadas russas fora de suas fronteiras desde a retirada das tropas soviéticas do Afeganistão, em 1989.

O governo russo justifica a intervenção no país afirmando que apoia o governo de Bashar al-Assad (tradicional aliado do Kremlin) e que grupos terroristas constituem uma ameaça para a Rússia. O temor é que extremistas islâmicos dominem a Síria e, em seguida, espalhem sua influência para além do Oriente Médio. Além disso, a Rússia tem o interesse de manter a base naval de Tartus, encravada no litoral sírio. A base é considerada estratégica por sua localização no mar Mediterrâneo.

A Rússia tem sido alvo de críticas dos EUA e de países membros da OTAN por seus ataques aéreos. Já o governo russo nega a morte de civis. “Apesar de toda a gente nos acusar disso, não há qualquer prova que bombardeamos civis. É falso", declarou Dmitri Medvedev, primeiro-ministro da Rússia.

Em setembro, outro episódio esfriou as relações entre Rússia e EUA. Um comboio de ajuda humanitária da ONU ficou sob fogo armado em Aleppo, na Síria. Como resultado, 20 pessoas morreram e foram destruídos caminhões com medicamentos para os moradores da cidade ocupada. Militares americanos acusam os russos e forças sírias de abrirem fogo contra o comboio. Os porta-vozes oficiais russos, porém, negam.

A relação da Rússia e da OTAN na Síria é lembrada por muitos como uma herança da Guerra Fria, período conhecido pela tensão entre a União Soviética e seus rivais ocidentais. "A política da OTAN em relação à Rússia é pouco amistosa e, para ser sincero, parece que estamos a mover-nos rapidamente para um período de nova Guerra Fria”, declarou o primeiro-ministro russo.

Curdos

Os curdos são um grupo étnico e constituem a mais numerosa população sem um Estado no mundo. Apesar disso, sentem-se parte do Curdistão, território geocultural que engloba regiões de países como Iraque, Turquia, Irã, Síria e Armênia.

Na Síria, os curdos formam cerca de 10% da população, totalizando dois milhões de pessoas, mas nem sempre são tratados com igualdade pelo resto da população e administrações anteriores.

As forças armadas curdas combatem o Estado Islâmico. Parte dos curdos pertence à milícia Unidade de Defesa Popular, conhecida como YPG. Desde o início da luta contra o EI, diversas vitórias da coalizão internacional liderada pelos EUA contaram com ajuda dos curdos.

Turquia

A Turquia faz fronteira com a Síria. Sua maior preocupação é manter a segurança de seus limites territoriais e evitar o fluxo de armas e insurgentes. O país apoia os rebeldes que lutam contra o Estado Islâmico, mas também quer paralisar o avanço de combatentes curdos.

Os grupos rebeldes apoiados pela Turquia são formados por árabes sírios e turcos que lutam sob a bandeira do Exército Livre da Síria. Esse grupo faz oposição ao governo do presidente Bashar al-Assad e tenta derrubá-lo.

A milícia curda YPG, apoiada pelos Estados Unidos, é vista como inimiga da Turquia. Para o governo turco, a YPG é um grupo terrorista considerado uma extensão do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), que é proibido na Turquia.

Os turcos combatem há três décadas a insurgência curda no sudeste do país. Por isso, eles temem que ganhos da YPG na Síria fortaleçam os militantes do PKK no território turco.

Apesar de negar oficialmente que enviou tropas para a Síria, o exército da Turquia divulgou que realizou bombardeios contra alvos do YPG no norte sírio.  O temor do governo turco é que o grupo armado domine as cidades próximas à fronteira assim que o EI for expulso e declare-as como um território autônomo, aumentando a tensão entre o governo turco e os curdos.

Os Estados Unidos e a Europa consideram o PKK um grupo terrorista, mas enxergam a YPG como uma entidade separada e forte aliada no conflito sírio. Essa divergência causou tensões com a Turquia, país membro da OTAN.

O primeiro-ministro turco, Binali Yildirim, declarou que se preocupa com a formação de um "corredor do terror" na fronteira. "Estamos ali para proteger nossa fronteira, dar segurança de vida e propriedade para nossos cidadãos e assegurar a integridade da Síria. Nunca permitiremos a formação de um Estado artificial no norte da Síria."

A Turquia ainda possui uma posição chave no conflito. Depois que a Turquia abateu um avião russo, a Rússia impôs sanções comerciais sobre o país. A OTAN também se posicionou contra o avanço militar russo e causou uma tensão diplomática. Após a recente tentativa de golpe na Turquia, o presidente turco Recep Tayyip Erdogan reclamou da falta de apoio do Ocidente. Agora Rússia e Turquia tentam reaproximar as relações.

Irã

O Irã é uma potência regional e aliado histórico do governo de Assad. O presidente iraniano Hassan Rohani disse que apoia o governo da Síria na luta contra os rebeldes, considerados terroristas. O Irã também se opõe ao Estado Islâmico. O EI é uma milícia sunita que vê os persas como hereges que devem morrer.

O país já participou de ataques contra rebeldes ao lado da Rússia. Para o Irã, a subordinação de Assad é chave para impor freio à influência de seu grande rival na região, a Arábia Saudita.

Arábia Saudita e países do Oriente Médio

A Arábia Saudita integra desde o início a coalizão liderada pelos EUA para atacar o EI. Também se opõe a Bashar Al-Assad e apoia rebeldes sunitas. O país está disposto a enviar tropas por terra.

Recentemente a Arábia Saudita rompeu relações com o Irã. Os dois países disputam a influência regional no Oriente Médio. Em várias ocasiões, ficaram em lados opostos de disputas, como na guerra civil da Síria.

Outros países do Oriente Médio integram a coalizão liderada pelos EUA: Bahrein, Jordânia, Catar e Emirados Árabes Unidos. Já Israel apoia a queda do governo de Bashar al-Assad, aliado do Irã e do grupo xiita libanês Hezbollah (tradicional inimigo de Israel).

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